30 Nov, 2009
De quem não gosto
De quem eu gosto, nem às paredes confesso, dizia uma canção que fez sucesso há muitos anos. A verdade é que ainda hoje, muitos dos faladores, opinantes, inventores, caluniantes, ou simplesmente conversadores, pronunciam-se exclusivamente sobre quem não gostam, mais, sobre quem detestam e a quem abrem guerra permanente e sem quartel.
Para mim não há qualquer surpresa nessa atitude, embora gostasse de saber, por pura e simples curiosidade, quais são as alternativas aos seus (des)gostos. Parecia-me razoável que quem tanto investe neste campo, justificasse esse investimento, revelando o lucro das suas preferências mais ou menos escondidas.
Posso dizer que não gosto de feijão-frade. Posso justificar que não gosto de nada nem de ninguém, com duas caras, e o feijão-frade tem. Mas então, também podia ir revelando que gosto de feijão de manteiga, embora tenha umas pintinhas no meio da sua cor principal. Mas, eu gosto de feijão de manteiga por causa da manteiga que ele não tem mas, para mim, basta fazer de conta que tem.
A manteiga está muito ligada a quem se gosta, e a falta dela, está na origem de muita antipatia que por aí se manifesta a todo o momento.
Há quem goste de feijão verde, principalmente, aqueles que já arranjaram úlceras no estômago com as arrelias que lhe pregaram ou, com as que os ulcerados já pregaram aos outros. A consciência doeu-lhes tanto, que provocou aquela fartura de azia não digerida. Quem já entrou na fase do feijão verde, é melhor retirar-se quanto antes de certas lides mais nervosas, por causa dos gostos e desgostos a que está sujeito.
Quem gosta de feijão vermelho, ou encarnado, se alguém preferir, é certo e sabido que acaba de entrar na mutação de gostos nacionais, em que o tom mais intenso ou menos intenso da cor, faz toda a diferença, para ser odiado ou bendito, isto é, para ser abraçado ou empurrado por outros feijões mais amanteigados, ou mesmo de duas caras.
Do que eu gosto mesmo é do feijão branco, cor impoluta e angelical, só detestável quando alguém com instinto bárbaro, se lembra de lhe meter no meio, aquela coisa a que chamam mão de vaca ou pé de porco, quando podiam perfeitamente optar por substituir esses indigestos poluentes, por uns chocos, desde que, antecipadamente, fossem limpos como deve ser.
Muito mais ao jeito dos bons estômagos de gente de barba rija, lá se arranja uma feijoada, onde o feijão de qualquer cor, fica escondido no meio do molho amanteigado e dos indiferenciados bocados de mil e uma carnes, sempre de porco. Coisa mesmo ao gosto de quem quer mesmo de tudo no seu prato, de quem gosta de tudo, mesmo que não goste de todos.
É muito mais fácil falar sobre os feijões de que gostamos ou não gostamos, que falar de pessoas, principalmente, daquelas de que gostamos, mas não gostamos de o tornar público. Tenho impressão que isso até pode significar uma certa hipocrisia, quando alguém tem receio de comparações entre quem se gosta e quem se odeia.
Há coisas que nem às paredes se confessam.