31 Ago, 2008
Afinal
Alguém terá pensado que este Verão seria completamente diferente dos anteriores e alguém terá feito planos baseados nesse singular pensamento. Não se trata das temperaturas mais altas ou mais baixas previstas pela meteorologia, naturais condicionantes das férias mais agradáveis ou menos conseguidas nos areais das praias nacionais ou estrangeiras. Não se trata da temperatura política do país, onde apesar de muito se falar de Verão quente, apenas se sentiram uns pequenos arrepios que quase ninguém sentiu. Tão pouco se agravou a temperatura nas bombas dos combustíveis, pois até se verificaram aquelas descidas que provocam sempre menos entusiasmo que as subidas. Na verdade, aconteceu uma coisa completamente inesperada.
Todos os entendidos em crises vaticinavam um Verão com as praias vazias, os restaurantes às moscas, as estradas sem carros, logo, sem acidentes nos dias que em anos anteriores eram críticos, quanto a acidentes rodoviários. Tudo porque os portugueses estavam tesos, sem cheta, com a classe média a comer das bondosas organizações de distribuição gratuita de comida. Sim, porque era a classe média que ia de férias, que enchia os restaurantes, atulhava as estradas de carros a caminho do litoral e engrossava a lista de mortos e feridos, próprios da época estival. Era, dizia-se.
Houve até quem se imaginasse na praia com dezenas de metros quadrados à sua inteira disposição para jogar futebol à vontade, passear o cão e dar-lhe banho sem reclamações. Houve até quem imaginasse restaurantes com saldos de cinquenta por cento para atrair os raros turistas nacionais. Houve até quem fosse de carro a transbordar de tralha, convencido que encontraria uma casa para alugar ao preço da chuva da época. Esperanças baseadas na tal crise que punha o país no epicentro de um grande terramoto económico-social.
Pura desilusão. Tudo como dantes. Gente e mais gente por tudo quanto era sítio. Ao sol, à sombra, nas praias, nos restaurantes, nas cervejarias, nos bares, nos casinos, nos hotéis, nas esplanadas, enfim, em todos aqueles locais onde a classe média ainda pode utilizar o cartãozinho de crédito, já que, como tanto se tem propalado, está tudo teso. Estava, dizia-se.
Mas, isso também não espanta ninguém. É sabido que essa coisa de pagar a dinheiro já se não usa, já que o dinheiro também já é uma ficção no bolso dos portugueses. Era o que se dizia.
Afinal, os grandes analistas sócio económicos não se enganaram muito. Quem se enganou redondamente foram os egoístas que pensaram que seriam os únicos a ir de férias e a beneficiar da ausência dos pobres coitados que teriam de ficar em casa, sabe-se lá até quando. Provavelmente, até que a situação se mude para as preferências e para os interesses dos que não se conformam com a ideia de que, afinal, a crise não é geral.