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afonsonunes

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30 Nov, 2009

De quem não gosto

 

De quem eu gosto, nem às paredes confesso, dizia uma canção que fez sucesso há muitos anos. A verdade é que ainda hoje, muitos dos faladores, opinantes, inventores, caluniantes, ou simplesmente conversadores, pronunciam-se exclusivamente sobre quem não gostam, mais, sobre quem detestam e a quem abrem guerra permanente e sem quartel.
Para mim não há qualquer surpresa nessa atitude, embora gostasse de saber, por pura e simples curiosidade, quais são as alternativas aos seus (des)gostos. Parecia-me razoável que quem tanto investe neste campo, justificasse esse investimento, revelando o lucro das suas preferências mais ou menos escondidas.
Posso dizer que não gosto de feijão-frade. Posso justificar que não gosto de nada nem de ninguém, com duas caras, e o feijão-frade tem. Mas então, também podia ir revelando que gosto de feijão de manteiga, embora tenha umas pintinhas no meio da sua cor principal. Mas, eu gosto de feijão de manteiga por causa da manteiga que ele não tem mas, para mim, basta fazer de conta que tem.
A manteiga está muito ligada a quem se gosta, e a falta dela, está na origem de muita antipatia que por aí se manifesta a todo o momento.
Há quem goste de feijão verde, principalmente, aqueles que já arranjaram úlceras no estômago com as arrelias que lhe pregaram ou, com as que os ulcerados já pregaram aos outros. A consciência doeu-lhes tanto, que provocou aquela fartura de azia não digerida. Quem já entrou na fase do feijão verde, é melhor retirar-se quanto antes de certas lides mais nervosas, por causa dos gostos e desgostos a que está sujeito.
Quem gosta de feijão vermelho, ou encarnado, se alguém preferir, é certo e sabido que acaba de entrar na mutação de gostos nacionais, em que o tom mais intenso ou menos intenso da cor, faz toda a diferença, para ser odiado ou bendito, isto é, para ser abraçado ou empurrado por outros feijões mais amanteigados, ou mesmo de duas caras.
Do que eu gosto mesmo é do feijão branco, cor impoluta e angelical, só detestável quando alguém com instinto bárbaro, se lembra de lhe meter no meio, aquela coisa a que chamam mão de vaca ou pé de porco, quando podiam perfeitamente optar por substituir esses indigestos poluentes, por uns chocos, desde que, antecipadamente, fossem limpos como deve ser.
Muito mais ao jeito dos bons estômagos de gente de barba rija, lá se arranja uma feijoada, onde o feijão de qualquer cor, fica escondido no meio do molho amanteigado e dos indiferenciados bocados de mil e uma carnes, sempre de porco. Coisa mesmo ao gosto de quem quer mesmo de tudo no seu prato, de quem gosta de tudo, mesmo que não goste de todos.
É muito mais fácil falar sobre os feijões de que gostamos ou não gostamos, que falar de pessoas, principalmente, daquelas de que gostamos, mas não gostamos de o tornar público. Tenho impressão que isso até pode significar uma certa hipocrisia, quando alguém tem receio de comparações entre quem se gosta e quem se odeia.  
Há coisas que nem às paredes se confessam.
 
29 Nov, 2009

Tempos difíceis

 

Essa coisa de se dizer que o país atravessa tempos difíceis é uma força de expressão mas, muito mais ainda, é uma expressão sem força para convencer aqueles que nunca tiveram uma vidinha tão boa. É fácil saber quem são esses felizardos que, apesar de tudo, aparentam sentir-se no pior dos países do mundo, quando se manifestam.
É evidente que só não os conhece quem anda de olhos vendados, ou não os quer abrir suficientemente, com receio de que alguém lhe leia neles o que lhe vai no interior do couro cabeludo. Há quem diga que os olhos são muito traiçoeiros, principalmente, os daqueles que passam a vida a olhar de esguelha.
Depois, há quem seja muito mais exagerado ainda, ao dizer que vivemos momentos difíceis. Era bom, era, que fossem apenas momentos. Nem tempos, nem momentos difíceis, para quem tem uma vida inteira de dificuldades, ao contrário dos que nunca saíram dos momentos fáceis e, ao mesmo tempo, provocadores de muitas dificuldades alheias.
Por mim, até os conheço só pela maneira como oiço tratar aqueles de quem falam. Até podem ser todos vigaristas, mas uns são vigaristas respeitáveis, tratados apenas pelo nome e ou qualificação, sempre dignificante, sempre respeitável. Outros, que podem ou não ser vigaristas, são tratados pelo ferrete de qualquer ideário detestado, ou função em sentido de desprezo.
Há os vigaristas bons e os vigaristas maus, há os que andam sempre associados aos bons exemplos e os que andam sempre ligados aos maus exemplos, sendo mais que visível a crueldade de trocar muitas vezes os papéis dos maus e dos bons, conforme as conveniências que são, quase sempre, as conveniências da ‘partidarite’ aguda.
É por isso que os tempos são ainda muito mais difíceis, porque as dificuldades não só não são combatidas, como ainda são aumentadas de dia para dia, com as várias espécies de vigaristas a tomarem de assalto tudo quanto devia ser ‘desvigarizado’ urgentemente.
É impressionante como vemos uns determinados profetas do saber e da inteligência, armados em anjinhos salvadores, a tentar vender ilusões e sonhos que nunca poderiam dar mais que vigarices atrás de vigarices, ou tomar para si todos os privilégios escandalosos que tanto afirmam combater.      
Se temos tempos difíceis agora, e temos, bem podemos esperar roturas e calamidades que não vão durar apenas uns tempinhos, e muito menos uns momentos, mas sim gerações condenadas igualmente pelos que não são capazes de dar nada de si próprios, quer sejam os egoístas que mais poderiam contribuir, abdicando de alguns excessos, quer sejam os egoístas que tudo reclamam, mesmo alguns excessos também, exclusivamente com os olhos postos nos seus interesses.
Tudo indica que uns e outros venham a sentir os efeitos nocivos da sua teimosia em não serem capazes de encontrar um ponto de equilíbrio nas suas actuações que, mais tarde ou mais cedo, se mostrarão ruinosas para todos.
Tenho a sensação de que vejo ao meu redor muitos candidatos a heróis dentro da obstinação pelo supérfluo. Tenho a sensação de que não vão passar de ídolos de barro que o próprio vento se encarregará de tombar na primeira baforada em que os tempos difíceis sacudirem o terreiro.   
Tempos houve em que ouvi dizer muitas vezes que não havia fome que não desse em fartura. Estou firmemente convencido de que não tardarão os tempos em que tudo virará do avesso e, então, não me admiraria nada que se ouvisse proclamar que não há fartura que não dê em fome.
Infelizmente, há muita gente que não acredita que o mundo muda a cada minuto que passa. Mas não muda no sentido que cada um de nós deseja. Pois é, tempos difíceis e o mundo está cada vez mais difícil.
 
28 Nov, 2009

PS 41 - PSD 25

 

Sinceramente nem sei que dizer a isto, porque nem me parece um resultado de basquete nem de andebol, para não dizer que seria uma enormidade se fosse um resultado de futebol.
Para ser resultado de basquete é demasiado curto, a menos que ambos fossem uma nulidade no lançamento ao cesto. É claro que sempre há uma diferença entre nulidades, pois enquanto um, teria apenas vinte e poucos por cento de eficácia em jogos normais da modalidade, o outro andaria pelos cinquenta por cento.
Uns nabos, diria a minha prima, que até acha preferível ter a boa performance dos seis, dos oito ou dos doze que, somados, sempre dão vinte e seis e, muito melhor ainda, somados aos vinte e cinco, dão para aí uma remessa deles por cento. Confortável, muito confortável, diria ela orgulhosa das suas preferências.
Mas, para aquele título ser um resultado de andebol, então estaríamos perante uma abada dos diabos, coisa inadmissível para o meu primo, marido da minha prima que, além de só gostar do Benfica, não acredita que o PS e o PSD tenham equipas seja lá do que for. Diz ele que, para baboseiras, já bastam as que vêem lá de cima.
Sim, porque ele vive lá em baixo, onde as coisas são muito mais terra a terra, com empates frequentes, aliás, onde quase tudo acaba empatado, devido ao barulho ensurdecedor das bancadas, que até na marcação dos fatídicos pontapés da marca de grande pateada, se chega a temer pela segurança do piso inferior.
Parece que alguém já se deu conta destas anormalidades e vai daí, logo se tomaram medidas para desempatar, quando não há resultado favorável a uma, ou às quatro partes das bancadas. Então, os quatro berros mais fortes produzidos durante a discussão do jogo, contam a dobrar, à semelhança dos golos marcados fora, no estádio.   
Esta decisão foi muito oportuna, porque todos os problemas do país encaixam perfeitamente no que se passa na bola, principalmente no futebol, onde os bons exemplos nem sempre são aproveitados, por exemplo, na política. Todos sabemos que ninguém liga nenhuma aos quarenta e um a vinte e cinco, quer se considere um resultado feito pelo árbitro, quer se diga que quem manda são ao que estão nas bancadas.
Ora o meu primo, de vez em quando, pega-se com a minha prima por causa das pessoas que ambos conhecem e daquilo que ambos julgam que elas deviam fazer. Por exemplo, os presidentes. Pergunta ele, para que raio há-de haver presidentes, se eles só servem para assobiar do camarote de honra para dentro do campo?
Logo a minha prima, que não é de meter os dedos na boca, pergunta se ele está a falar do presidente do clube ou de quê? Na verdade, até eu, que não tenho nada a ver com as conversas tontas deles, fico na dúvida. E ainda por cima, com as desavenças deles ao rubro, nem sequer lhes posso pedir uma explicação esclarecedora.
Sinceramente, quarenta e um a vinte e cinco, seja lá qual for a modalidade ou a competição em que se verificou tal resultado, tem de ser imediatamente anulado por um ruído ímpar das bancadas, para que nunca mais uma bola redonda se sobreponha à vontade de uma bancada oval.
Não sei onde é que eu vi este resultado, mas foi hoje mesmo. Estou um poço de confusões, porque os partidos, penso eu, não gostam de perder nem a feijões. E, realmente, nunca perdem. Tenho dito.
 

 

Amigos para governar ou para desgovernar.
Amigos para salvaguardar os seus interesses ou os interesses de quem mais precisa.
Amigos para satisfazer vinganças ou para beneficiar o país.
Amigos para destruir ou para construir.
Amigos para cumprir um projecto que não existe ou para anular um projecto que existe.
Amigos para fazer amizade ou para fazer uma união de ódios.
Amigos para defender ideias comuns ou para atacar ideias contrárias.
Amigos, eles não são com certeza, nunca o foram, nem nunca o virão a ser.
Amigos de Peniche, amigos da onça ou um grupo de inimigos, contra o inimigo comum.
Quem tem amigos destes, não precisa de inimigos.
O país virá, mais cedo ou mais tarde, a saber os amigos que tem.
Resta saber quanto tempo resta a estes amigos, para que o país os conheça bem.
E quanto tempo será preciso para que eles próprios se conheçam o suficiente para se abraçarem pelo serviço prestado ao país.
Amigos. Fico à espera de ver o resultado.
 
26 Nov, 2009

Tentáculos

 

Das redes tentaculares às pequenas redes anda muita gente envolvida, mesmo sem contar com as redes de pesca artesanal, onde os artistas são todos amadores logo, nem sequer estão sujeitos ao pagamento de impostos, como qualquer cidadão que não tem tentáculos, ainda que adore os ditos do polvo, com arroz ou sem ele.
Uma rede tentacular é toda a ‘tropa fandanga’ de um partido que ninguém compreende como é que anda tanta a gente atrás dele, uma vez que só faz asneiras, que só tem malandros do primeiro ao último dos seus aderentes e simpatizantes e que, ainda por cima, ganha eleições.
Uma pequena rede é aquela que se vê logo à vista desarmada que não tem tentáculos, pois os elementos que a compõem movimentam-se mais na base do cérebro, pelo que se pode dizer que é uma rede cerebral. Pode dizer-se mesmo que é uma ‘tropa de élite’, que não se mexe por milhares, mas sim por muitos milhões. Claro que também não podia estar fora da esfera partidária, embora essa esfera seja quase opaca, para o exterior e no próprio exterior.
Enquanto a ‘tropa fandanga’ ganha eleições, a ‘tropa de élite’ perde eleições mas, se formos a contar os elementos de cada uma das tropas, esta última ganha por grande maioria. Tal prerrogativa, mostra que, apesar das aparências, tem muito mais tentáculos que uma rede tentacular. Coisas dos nossos linguistas ou, aparentemente, problemas dos óculos dos ditos, para não levar o caso para algum problema de desconhecimento da tabuada.
Por exemplo, uma rede tentacular pode ter para aí uns dez a quinze arguidos, enquanto uma pequena rede pode chegar aos vinte e muitos. A rede tentacular mete-se com ninharias de sucatas que, para além de ferrugens, nunca dá os milhões que um banco fornece até ficar completamente exaurido, como nos lixou já a pequena rede.
É evidente que a rede tentacular pode vir a ser um monte de trabalhos mas, por enquanto, ainda é apenas um monte de sucata. Quanto à pequena rede, é um monte de milhões que já estão a sair, e vão continuar a sair, dos meus bolsos e de todos aqueles que só estão preocupados com as sucatas.
Isto não quer dizer que eu próprio não esteja preocupado com as sucatas, com os sucateiros, com as luvas que eles têm de usar no manuseamento da ferrugem, e com todos os que possam vir a estar com as mãos sujas e que, mais adiante, podem vir a ser muito mais do que aqueles que agora estão na berlinda.
O que não tenho é aquela tendência mórbida para esquecer a ‘tropa de élite’, tentando encobri-la com a ‘tropa fandanga’, atribuindo a esta, constantemente, origens que se omitem, sistematicamente, em relação àquela.
Para mim, estão em causa pessoas, personalidades, que, de um lado ou do outro, só podem ser incriminadas por quem de direito e após conclusão dos respectivos processos. Processos que estão mais adiantados ou mais atrasados, mas que só valem após passarem pelos tribunais.
Daí que, pelos que já por lá passaram, podemos tirar ilações que não condizem nada com a algazarra que vai por aí. Sobretudo, porque se quer fazer crer que os corruptos moram todos na mesma rua. Porque se quer fazer crer, que quem mais fala na corrupção, é quem mais está fora dela. Porque há quem pense que tem o génio suficiente para semear ilusões.  
Entre sucateiros e banqueiros, há muitos mixordeiros que nadam em duvidosos dinheiros.
 
25 Nov, 2009

Mais um aborto

 

O que vale é que o aborto já está legalizado em Portugal, embora haja por aí, no dia de hoje, muitos dos seus críticos com uma tremenda carapuça enfiada na cabeça até às orelhas. É que este aborto não era, nem de longe nem de perto, desejado. Pelo contrário, este feto devia nascer e crescer suficientemente robusto para ser o fim de um pesadelo para muita gente, que desejava um funeral de gente grande, já largamente preparado, tal como antes de outros abortos.
Foi realmente um dia decepcionante para todos aqueles que andaram a deitar foguetes numa festa que, esfriando num dia, logo recomeça no seguinte, com redobrado entusiasmo, apesar de já durar há mais tempo que aquelas pilhas que duram e duram.
Volta não volta, como em todas as festas, lá aparece um contratempo inesperado e traiçoeiro, sempre provocado por alguém que fura o espírito festivo do pessoal. É como se um aborto interrompesse uma gravidez de risco zero. Acontecimento lamentável mas, tudo tem remédio, quando a vontade supera os contratempos que nos chateiam.
Portanto, não há problema, se uma gravidez abortou, vamos de imediato para nova gravidez, porque a festa não pode parar. Depois, há o precedente de haver gravidezes que duram anos. Apesar das barrigas inchadas e de alguns enjoos acidentais, o desejado nunca mais nasce, nunca mais aborta, nem nunca mais a coisa fica despachada.
Acontece que esta coisa, também tem a outra face. Nesta, a frase mais adequada é, nem o pai morre, nem a gente almoça, tal o estado de ansiedade que domina quem já está a deitar os bofes fora por causa das festas alheias. Sim, porque se os festeiros têm direito à manifestação festiva interminável, o causador dela não tem direito à indignação, restando-lhe a resignação de aguentar a pé firme e evitar a cerimónia fúnebre que lhe está preparada.
Estado de ansiedade que devia, no entender dos festeiros, levar o paciente ao tal funeral que também nunca mais chega, adiando assim, indefinidamente, o cúmulo dos festejos, que acontecerá quando se der o nascimento e o funeral. Não se sabe quantas gravidezes terão de vir ainda, com os respectivos abortos, nem tão pouco, se haverá defunto disponível para o desejado funeral.
Quando se olha demais para o funeral dos outros, há o risco de não se chegar lá, e ser o falso morto a acompanhar quem devia ser seu acompanhante. Sei que isto está tétrico demais para tantas festas ao redor. A verdade é que também já vou ficando farto de ver abortos, embora saiba perfeitamente que estão todos legalizados, apesar de haver frequentemente uma questão de prazos de semanas, meses, ou até anos, o que provoca algumas reacções negativas. Principalmente, por causa da limitação imposta pela tradição milenar dos habituais nove meses.
Porém, tudo isso são questões marginais, legalismos inaceitáveis, quando estão em causa coisas tão sérias como as festas e os funerais, principalmente, quando nunca mais chegam quando a gente tanto os deseja. A gente, salvo seja, esta gente é a das festas e dos funerais, que não pensam noutra coisa, só porque não têm mais que fazer, que meter-se na vida dos outros.
Contudo, é preciso ter muita calma, porque hoje foi um dia triste no meio das festas. O aborto inesperado e incómodo fez recuar muita língua, calou muita música e fez rebentar muitos foguetes na mão de quem andava a deitá-los alegremente.
Amanhã é um novo dia, no qual já ninguém se lembra do aborto porque, durante a noite, na cama, foi restabelecida a normalidade democrática, no intervalo entre dois sonos leves. Depois, é só esperar para ver o resultado. 
24 Nov, 2009

A face inculta

 

Não há como fugir deste sortilégio das faces, tão fascinante é entrar neste mundo sem saída, onde podemos dar de caras com uma face bem visível, que não nos deixa a menor hipótese de fantasiarmos sobre o que vemos, ou depararmos com uma face que apenas podemos imaginar que existe, porque dela não vemos nada de concreto.
Nos meandros deste sortilégio parece haver muitas faces incultas, a avaliar pelas mais variadas teorias, das quais saliento uma cheia de graça, que ouvi hoje mesmo na televisão, a um conhecido jurista. Disse ele a brincar, que em cada dois juristas, há sempre três opiniões.
Suponho que foi isso que ouvi e, não me admiraria mesmo nada, se ele não estivesse a brincar, porque em matéria de teorias dessa área, penso que cada jurista pode perfeitamente arranjar várias teorias para cada caso, dependendo a natureza e complexidade de cada um, do teor mais ou menos extenso do extracto da conta bancária do cliente.
Agora sou eu que estou a brincar, mesmo sem graça nenhuma, pois não quero meter-me a sério, neste sortilégio das faces, nem no sortilégio que podem constituir muitas das teorias que alimentam este mundo devorador, que é capaz de ler e explicar uma coisa, segundo várias interpretações, algumas completamente contraditórias.
Um sortilégio perfeito, que faz corar a face mais pudica de qualquer cidadão que, mesmo não conhecendo nada de teorias simples ou esquisitas, sabe o que é a lógica da batata, que é como quem diz, sabe o que é estar à vista ou estar oculto, mesmo correndo o risco de ser considerado mais inculto que o culto que o não é.
Porque a cultura que se tem ou não se tem, não depende apenas dos cartapácios que se folhearam, provavelmente, alguns deles de olhos já bem fechados, ou a pensar nos prazeres de uma vida bem mais apelativa que leituras tão incómodas. Daí que os incultos, que também têm duas faces, tenham muitas probabilidades de não esconderem nenhuma delas.
Simplesmente porque não têm engenho nem arte para recorrerem aos sortilégios de certas sabedorias que ajudam a mudar, a todo o momento, a face visível para o lado oculto, deixando uma cara pouco lavada à vista de quem sabe olhar de frente sem ter necessidade de piscar o olho seja a quem for.
Deixem-me pois prestar a minha homenagem a todos os incultos que olham para tudo o que se está a passar ao lado deles e viram as costas com um sorriso nos lábios, dizendo simplesmente, que isto não é nada com eles. E têm toda a razão, pois com eles é apenas aquilo que eles percebem e isto não é mesmo para perceber.
E aqui, como em tantas outras coisas, felizes são os que não percebem as complicações e os disparates que só servem para desestabilizar o equilíbrio mental de tanta gente que se preocupa demais com o que vê, o que lê e o que ouve, por recear que a sua vida não possa ter futuro, no meio de quem só pensa em estragá-lo.
Está bem provado que é muito mais fácil dois analfabetos entenderem-se, que dois altos intelectuais chegarem a acordo sobre determinados assuntos sensíveis, como eles costumam dizer. Eu diria que, provavelmente, eles serão dois grandes insensíveis.
Seria bom que todos quisessem mostrar aos outros a sua face oculta, porque a face inculta, essa, está sempre à vista de toda a gente. 
 

 

Era só o que faltava, o país inteiro a ficar sem assunto e deixarem o homem tranquilo, assim, sem mais nem menos. Não, o escarcéu tem de continuar, o país tem de se indignar, seja lá qual for o assunto que os especialistas vão desencantar, ou desenterrar, conforme se trate de uma novidade, ou de uma reposição de recurso.
Assim, neste marasmo igual ao dia cinzento que tivemos hoje, é que isto não pode ficar por muito mais horas. Só não digo minutos porque há sempre aquela onda de choque a perturbar os mais sensíveis que, momentaneamente, mudam o seu olhar perspicaz e semi-acusador para quem consideram culpado desta pausa sonolenta.
Mas, pausa ou intervalo, não se pode confundir com o fim, nem que seja numa fita de cinema, quanto mais numa novela de alta definição, de alta competição e de alta amarração. Sim, porque isto traz muita gente amarrada logo, não se pode, de ontem para hoje, escrever ‘fim’ no meio da página, ainda antes do ponto final.
As pausas ou intervalos servem, precisamente, para reunir as forças indispensáveis, para depois as canalizar no sentido que determinar a reflexão que, entretanto, individual ou colectivamente, se tiver feito. Convém que tudo isso não demore mais que alguns minutos, senão a folga prolongada que se dá, é contraproducente para o recomeço do escarcéu. 
É por isso que isto não pode ficar assim, senão, há logo quem pense que a novela terminou de forma inesperada e abrupta, quando toda a gente está habituada aos finais felizes, que metem foguetes e filarmónicas, casamentos de todos os que namoravam, copos com fartura, para esquecer as agruras passadas.
Aqui, as coisas não se passam assim, porque há muitos namoros, mas ninguém se casa com ninguém. Até é frequente haver uns beijinhos fugidios que logo a seguir se transformam nuns empurrões nada meigos, com o maior escarcéu à mistura. Mas, cá para o meu gosto, assim é que está bem.
Essa do quanto mais me bates mais gosto de ti, não se aplica mesmo nada a esta marmelada de novelas que metem gente demais, retirando-lhes aqueles desejos que só se têm com alguma privacidade e isso é coisa impossível durante pequenas pausas e no meio de grandes escarcéus.
Portanto, venha de lá o próximo episódio que, se tudo tiver sido bem planeado, com competência e profissionalismo, já deve estar pronto a ir para o ar nos próximos minutos porque, quem se atrasa, está a dar trunfos à concorrência. Que, como se tem visto, é muito forte e não dá baldas a ninguém. Nem que seja ao mais pintado.
Para quem ainda não tenha reparado, isto interfere com o estado das pessoas. Pessoas que têm direito à novela, todos os dias, à hora certa. Se não for assim, isso constituirá um atentado aos usos e costumes dos cidadãos que não querem saber se há, ou não, quem seja culpado por essa falta tão grave.
Depois, é fácil verificar que isso tudo junto, constitui mesmo um atentado ao estado de direito das famílias, que até se tornam desavindas neste estado de escarcéu, sem o qual já não há bons chefes de família. Alguém dirá que já não fazem falta nenhuma, porque já temos chefes que cheguem para nos moer o juízo.
Sobre isso nem abro a boca, mas garanto que isto não pode ficar assim.
 
21 Nov, 2009

Acho muito bem

 

Por vezes oiço uns zunzuns que me deixam de orelhas arrebitadas, como se eles me trouxessem uma esperança de vida largamente acrescida e, com a grande vantagem, de a viver com incomparável melhor qualidade de vida, não só para mim, mas para muita gente mais, que passa as passinhas do Algarve, por causa de umas excelências que erraram a vocação a que tão interesseiramente se devotaram. 
Ora, os zunzuns a que me refiro parece que dizem respeito a umas mudanças políticas da maior importância, ou seja, o nosso presidente passaria a nomear todas as entidades reguladoras, para que elas passassem a regular de outra maneira. É de supor que não regulem lá muito bem, principalmente da cabeça, suponho eu.
Estes problemas da regulação são muito mais importantes do que muita gente pensa. Por exemplo, continua a dar-se corda a um relógio que não funciona lá muito bem, embora ninguém perceba porquê. Se calhar nunca se repararou que o relógio só funciona com pilhas.
Acho interessante transportar isto para certas entidades a quem continua a dar-se corda, quando elas não têm corda nenhuma, nem guita, nem pilha, que lhes permita fazer qualquer coisa daquilo que deviam fazer, que é para isso que o Zé Paga Tudo lhes permite assinar um agradável recibo de vencimento certinho no fim de cada mês.
Pois bem, se calhar quem tem nomeado os reguladores, também não regula regularmente, digo eu, logo, justifica-se plenamente que essa função passe para o presidente, como referem os tais zunzuns que eu já ouvi em qualquer lado. No entanto, talvez fosse melhor, simultaneamente à transferência de poderes, enviar os meios necessários e suficientes, para que alguém não fique sobrecarregado de trabalho, sem a correspondente revisão salarial.
Para obviar a esses inconvenientes, o governo podia enviar-lhe as listas de reguladores já prontas a nomear, limitando-se o presidente a assinar cooperantemente. Como se vê, isto era ainda muito mais simples que o Simplex. E não me venham dizer que o Lima, ou outro qualquer, fazia melhor esse trabalhinho, tendo em conta a sua experiência pessoal.
Mas, em alternativa, se há sempre que desconfiar do que faz ou não faz o governo, então, o presidente decretava e mandava publicar, que todos os reguladores passassem a trabalhar junto do Lima, ou de outro qualquer, para estarem permanentemente vigiados, já que o governo nunca foi capaz de os vigiar.
Agora, também há que o referir, havia muito mais que fazer para aliviar o governo de todas as desconfianças que permanentemente atiram para cima dele. Uma dessas coisas, era arranjar muito mais reguladores para Belém, colocando o governo na prateleira, suscitando-me a dúvida se o palácio teria instalações suficientes para albergar todos esses reguladores, necessários ao regular funcionamento do país e à progressiva dispensa da acção governativa.
Tenho as minhas dúvidas se tal acumulação de reguladores num espaço tão exíguo, não originaria uma data de desregulações, porventura, irregulares e desreguladas. Também tenho as minhas mais sérias dúvidas se a própria Constituição, não ficaria, ela própria, desregulada, com tantos e tão sérios reguladores.
Aliás, isso da seriedade, é uma boa questão a ser colocada, pois a transferência da falta dela, de um palácio para o outro, podia constituir um grave desequilíbrio na opinião política nacional, já para não falar na pública, que é um pouco mais sensata e não precisa de reguladores.        
Resumindo e concluindo, concordo com todos os reguladores a regular em Belém, até porque lhes era muito mais fácil fazerem os seus plenários de entendimento geral, vulgo, cartelização, sem que alguém desconfiasse deles. Portanto, só tenho a dizer que acho muito bem.
No entanto, quem sou eu para achar, tudo aquilo que outros perderam.
 
 

 

Estranho muito que se diga que é preciso acalmar isto, quando os principais intervenientes se desdobram em garantias de que está tudo calmo, pedindo simplesmente que os deixem continuar a fazer tudo, como têm feito até aqui. Realmente, eles têm tido toda a calma do mundo, sob o olhar tranquilo, com palavras de muita confiança, por parte de quem agora diz que é preciso acalmar isto.
Pena é que não sejam eles a dizer abertamente que é preciso acabar com esta calma nervosa e hipócrita em que todos os dias há aplausos aos que criam todo este ambiente, quando essa calma põe nervoso o país inteiro e destrói de modo insensível e brutal os mais elementares direitos de cidadãos, só porque interesses mesquinhos os consideram criminosos, antes mesmo de serem ouvidos e acusados.
Mas, mais aberrante ainda, é que esses pré julgadores se arroguem em vítimas de quem os critica, porque se julgam senhores intocáveis e soberanos, mas também porque se queixam a todo o momento de que não os deixam trabalhar livremente. Como se não tivessem toda a liberdade do mundo para fazerem impunemente as muitas injustiças que falam por si.
Contra todas as vozes que diariamente se colocam ao lado dos autores desta deplorável situação, cito apenas três nomes de individualidades que não se comparam com tanta incongruência, má fé, ignorância até, em muitos casos. Mário Soares, Ramalho Eanes, Marinho Pinto e José Miguel Júdice são apenas quatro casos, de áreas políticas diferentes, que não entram nessa história de que tudo vai bem, ou que é apenas preciso acalmar isto.
Quem já viu as suas vidas completamente desmanteladas por erros clamorosos, quem já viu que após anos de serem considerados criminosos da pior espécie, tudo não passou de erros de palmatória, quem já viu que nem sequer lhes pediram desculpa pelos danos causados, quem já viu que lhes foram recusados processos contra os responsáveis, não pode olhar para tudo isto com um sorriso de consolação nos lábios, só porque lhe dizem que isto é normal, e que tudo isto vai acalmar.
Há quem fale em espionagem política e há quem pense em terrorismo de gente com responsabilidades nesta triste e lamentável situação. Há quem se ofenda com expressões desta natureza, esquecendo as expressões que usa a todo o momento, sem ver o alcance que elas têm, mesmo juridicamente, só porque julgam que têm, e têm tido mesmo, toda a impunidade que, embora mal, só é concedida a quem fala alto de mais.
Julgo que insultar, berrar, por exemplo, não pode ser considerado falar. Não há estado de direito, sem direitos de todos os cidadãos. Onde quer que alguém contribua decisivamente para que alguém viva num clima de terror provocado por outros, então há mesmo terrorismo, por mais que não se goste do termo.
Enquanto a liberdade de expressão estiver dependente daqueles que a querem só para si, recorrendo a todos os truques para que isso aconteça, tentando impedir que aqueles a quem atacam, não possam sequer abrir a boca, nem mesmo para se defender, então, está criado o ambiente favorável a que se procurem por todos meios, informações ou tricas, que os possam levar a massacrar os seus adversários.
A brincar ou sério, com sentido de humor ou sem ele, não levem tanto a peito a espionagem política porque há insultos bem piores que estas trocas de mimos entre o, toma lá, dá cá, da política, em que os mimos não devem estar limitados a um só lado da barricada.
Depois, o tempo das virgens pudicas, que alguns julgam que são, é tempo que já lá vai, para não dizer que foi chão que deu uvas.
 

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