16 Dez, 2009
Quero governar-me
Sim, quero governar-me, e escusam de começar a pensar que estou a delirar, porque tenho o direito de dizer o que me apetece e a obrigação de não estar a recalcar os meus desejos pois, segundo os entendidos, isso faz muito mal à saúde de quem a não tem. Depois, sou apenas mais um, entre tantos que fazem o mesmo.
Além disso, não vejo onde é que está a diferença entre governar-me, e alguém governar-se por mim, que é como diz, governar-se à minha custa. Isso sim, é anti-democrático, se atendermos a que ninguém pode mandar mais na minha vontade, que eu.
Depois, bem sei que a ideia de governar-me está associada a mandar. Na verdade, não posso governar-me se não mandar nada, e isso é que preocupa muita gente. Simplesmente, porque todos querem mandar e, se eu mandasse em qualquer coisa, eles já não mandavam em tudo.
Para tranquilizar esses mandões e candidatos a mandões, não me importo mesmo nada de me limitar a mandar vir com eles, o que já é mandar alguma coisa. Mas, assim, eles não perdem o mando, nem tão pouco têm de se preocupar em mandar vir comigo, até porque eu sou surdo que nem uma porta, quando se trata dessas coisas.
Isto, pode até parecer conversa de troca o passo, mas não é. Se pensarmos só um bocadinho, logo nos vem à ideia que esta coisa de mandar, está a dar volta a muitas cabecinhas, que também têm esse direito, tal como eu já disse e repito, que tenho. Ou há moralidade, ou comem todos.
E não é assim tão difícil mandar e governar-me, dentro da soberania da minha vontade, apesar de haver sempre uns contestatários que argumentam que eles também têm vontades. A esses, eu digo que a minha vontade é um desejo, enquanto a vontade deles é uma necessidade. Não tem nada a ver uma coisa com a outra.
Ora um desejo é sempre muito mais puro que uma necessidade. Não é difícil saber porquê. O desejo vai para a parte nobre do nosso cérebro e aí fica depositado, à espera de se tornar realidade. A necessidade, vendo bem as coisas, é um desperdício que vai por água abaixo.
Tenho plena consciência que não viria mal nenhum ao mundo se me governasse a mim próprio, mesmo contra a vontade de qualquer outro governo. Bastaria pensar que era menos um monte de trabalhos a chatear quem julga que tem o exclusivo da governação, só porque associa a palavra governo a governar. Por mim penso que um presidente também tem o direito, e o dever, de governar.
Esse é outro problema que se pode colocar com toda a legitimidade. É saber se somos obrigados a respeitar um exclusivo destes que, no fim de contas, é um verdadeiro monopólio. Ora, em pleno século das luzes, não há direito que ainda estejamos às escuras, a tentar jogar um jogo tão brincalhão, onde nem um chavo se ganha.
Já nem sei a que propósito fui buscar esta conversa de mandatos e governações. Tenho a sensação que uma coisa teria a ver com a outra mas, de repente varreu-se-me. Tenho cá uma impressão de que isto é um mal que se pega com a maior das facilidades, pois o que mais se vê por aí, e por aqui também, é gente a quem se varreu qualquer coisita.
O que vale é que são coisitas mesmo, sem importância nenhuma, como se pode verificar com o facto de a vida correr normalíssima, com as pessoas a ir à bola ver as aldrabices do costume, a ir ao cinema ver as fitas que, felizmente, não há cá fora, ou comerem uma latita de atum com feijão-frade, porque já enjoaram os bifes da vazia com batatas fritas do pacote.
A propósito, se eu me governasse à séria, do pacote só queria aquilo que há pouco se me varreu, ou não fosse um pacote recheado de ideias que o país precisa mas que, também ele, se tem queixado de que tudo se lhe tem varrido e que, tarde ou nunca, se libertará da vassoura que bem podia deixá-lo em paz e sossego.
Como se vê, até as vassouras andam por mau caminho. Em lugar de limpar, sujam. É por isso que eu quero governar-me, e ponto final.