Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

afonsonunes

afonsonunes

28 Mar, 2010

CANTO PRIMEIRO

 

Os barões já estão bem assinalados

No país da onda ocidental e lusitana

Com mares poluídos de tanto navegados

Pelos barcos rotos em que tudo abana

Com pobres em perigos e lutas esforçados

Mais do que permite a fraqueza humana

E mesmo assim com gente bera instalaram

O seu reino que tanto sublimaram

 

E lá vieram discursos com palavras gloriosas

Daqueles presidentes que se foram dilatando

Muito à custa das coisas viciosas

Que pelo país andaram semeando

E aqueles que por obras indecorosas

Se vão do pobre povo libertando

Esperam que a morte espalhe por toda a parte

As cinzas dos que não têm engenho e arte

 

Cessem do sábio grego e do grã troiano

As divagações grandes que fizeram

Calem-se os barões que não vão no metropolitano

E esqueça-se a força das mentiras que se disseram

Que eu vou com o português mais insano

A quem os astros de cá sempre favoreceram

Cesse pois tudo o que certa plebe canta

E será certo que outro berro se levanta

 

 

27 Mar, 2010

Às escuras, hoje?

Era só o que faltava, apesar de se perder apenas cerca de metade do jogo da Luz, o que é, curiosamente, revelador de que há quem queira, a qualquer preço, que a Luz fique às escuras. Quer dizer que alguém inventou esta história de deixar o país às escuras, precisamente neste dia e a esta hora.

Lá que exigissem que o túnel da Luz ficasse às escuras, bom, isso eu até entenderia perfeitamente, já que da outra vez houve uns xicos espertos que nem sequer repararam que as luzes estavam acesas e desataram a dar, sem olhar para as câmaras, nem para os desgraçados que apanharam.

Considero que isso foi a traição da luz, imperdoável para quem sabia que isso teria consequências monetárias e desportivas irrecuperáveis, a menos que o homem da Luz, dentro da sua incomensurável benemerência, se prontifique a pagar todos os prejuízos monetários e, muito mais importante, entregar o título numa bandeja de prata ao clube dos heróis agressores. Isto se houver título para pôr na bandeja. Se não houver, vai só a bandeja.

Mas, voltemos ao dia de hoje, em que o túnel da Luz deve ficar às escuras, para proporcionar o espectáculo complementar, muito mais animado e entusiástico que o do relvado, que até pode nem ser lá grande coisa. Se houver sarrafada no relvado, espera-se sopa no túnel. Se houver sopa no relvado, então no túnel vai servir-se a sobremesa. Mas, por favor, tudo com as luzes apagadas, senão não tem piada nenhuma.

Mas isto é na Luz. E na política? Então o homem tem a oportunidade de fazer hoje à noite o seu primeiro serão de trabalho, sentado no cadeirão do seu gabinete, pela primeira vez, repito, pela primeira vez, depois de toda a animação que tem vivido cá fora, e querem que ele apague a luz antes de entrar? É caso para dizer, não brinquem com o homem, até porque ele não pode perder um segundo sequer de trabalho, quanto mais uma hora.

É claro que ele até tem uma alternativa muito válida. Em lugar de jantar mais cedo, com as luzes acesas, e ir fazer serão com as luzes apagadas, basta-lhe trocar. Começa o serão ao pôr-do-sol e, às horas em que vão apagar as luzes, vai jantar romanticamente à luz das velas, com quem mais desejar neste final do primeiro dia, fazendo tudo pela primeira vez.

Dada a solenidade do dia e a necessidade de abreviar tudo o que tem de ser feito sem demoras, para não correr o risco de se esquecer que tem de as fazer, parecia-me bem que ele convidasse para este jantar de hoje, das oito e meia às nove e meia, com a mesa cheia de velas, mesmo apagadas, aquele que vai ter a sina de lhe deixar outro cadeirão vago, noutro gabinete, noutro palácio, que já espera por ele há muito tempo.  

Neste jantar que podia ser histórico, podia aproveitar para combinar a melhor maneira de fazer as coisas sem que ninguém as veja, dada a experiência do seu convidado e dada a inexperiência do anfitrião em matérias tão melindrosas e tão poderosas, que só o seu convidado, à luz de velas, ou às escuras, lhe pode iluminar a mente.  

De qualquer modo, registo aqui e agora, que alguém, maliciosamente, engendrou esta maquinação da hora sem luz, com perfeita consciência do que fazia, pois não pode ser uma ingénua coincidência, a escolha da hora no jogo da Luz e, com muito mais maldade ainda, a hora do serão, ou do jantar, do homem que vai fazer tudo pela primeira vez.

É por isso que há o perigo de tudo começar com as velas apagadas. Às escuras, por maldição de alguém que não gosta da luz.

 

26 Mar, 2010

Parabéns, tia!

Sim, parabéns, pois hoje não é um dia qualquer na vida da tia, essencialmente por dois motivos. O primeiro diz-me que ontem, a tia se deitou muito mais tarde que o costume, e o segundo que hoje, também se levantou muitíssimo mais tarde que o costume. Parece que isto não é motivo para tanta festa, mas é mesmo.

Olhe, tia, acredite que tenho cá as minhas dúvidas sobre o que vai fazer hoje, depois de se ter certificado de que, lá fora, não tem o motorista à espera, nem tem aquela horrorosa estopada de ir dar despacho ao expediente e responder, melhor, reagir, às parvoíces do costume.

De repente, até pode resolver ir dar uma voltinha pelo jardim, tentando apanhar aqueles raios de sol que espreitam sorrateiramente pela janela. Como se esperassem ver alguma coisa de jeito para lá dos cortinados e das persianas corridas, que não tardariam a abrir-se de par em par, pois até a caminha já estava feita.

O pequeno-almoço também estava quase despachado, apesar de ter sido um pouco mais substancial que o costume, logicamente, porque não tinha o motorista à espera, apesar de ele nunca ter tido o mau hábito de buzinar como meio de chamamento. Contra o costume, até o telemóvel ainda não tinha dado sinal de ter acordado para a rotina, que hoje já não era a do costume.

Apesar de tudo isso, a tia estava muito mais bem-disposta do que era costume. Só tinha uma pequena dúvida a ensombrar-lhe o pensamento. Ainda não sabia o que havia de colocar na sua agenda do dia, ao contrário do que era costume, pois a esta hora do dia já estava cheia e em plena evolução.

Ao pegar nela e na caneta fina, com um misto de alívio e de sensação de um vazio interior, respirou fundo e passou um traço vertical na página do dia. Pronto, o problema da agenda estava resolvido e, cumulativamente, lá se ia o problema de ter de reagir às mentiras do dia. Sim, porque a tia há muito que não reagia a uma verdade sequer.

Porquê? Pela simples razão de que a tia já estava habituada a ouvir apenas mentiras. Daí que já tivesse feito um teste médico para verificar se não estaria, também ela, contaminada com o mesmo mal, devido ao perigoso efeito de contágio directo. Felizmente para ela, o teste deu negativo e o médico garantiu-lhe que estivesse calma e serena, que aquilo não era nada.

Agora, a tia estava mesmo preparada para enfrentar o primeiro dia sem agenda. Uma vez chegada à porta de saída, levantou a cabeça e olhou à sua volta, como se escolhesse a rua que devia percorrer calmamente, a pé, decidindo-se pela que tinha o comércio mais chique, na esperança de que até encontrasse alguma loja com saldos extemporâneos.

Duas horas mais tarde, já um tanto exausta, passava em frente do Palácio de S. Bento. Sem saber porquê, sentiu um arrepio de frio que lhe percorreu a espinha toda. Não era costume ter arrepios daqueles, mas logo pensou que os seus costumes estavam mesmo a mudar.

Estava a tia nesse adiantado estado de melancolia quando alguém lhe tocou no ombro e a convidou a retomar a marcha, lembrando-lhe que águas passadas não movem moinhos. Ela apressou-se a perguntar ao seu interlocutor, se já estava a pensar em mudar-se para ali.

A resposta não se fez esperar, informando que vinha precisamente a tirar as medidas ao palácio, já que acabava de chegar à conclusão de que não podia perder nem mais um dia na situação em que ela esteve durante tanto tempo.

A tia olhou para ele, viu as olheiras que ele ainda tinha dos festejos da noite anterior e, deliberadamente, sorriu. Não se sabe o que, para ela, significava esse sorriso. Mas ele, bem ou mal, achou que ela estava feliz por ele.  

Parabéns, tia. Hoje, já só ouve mentiras se quiser. No entanto, tem o privilégio de ler hoje, aqui, contra o costume, a sua vidinha de amanhã.

 

25 Mar, 2010

Vai ou racha

Parece que é mesmo desta que a coisa vai, só me restando saber o que é, afinal, essa coisa de que já ouvi falar várias vezes no decorrer desta véspera de sabermos se, efectivamente, essa misteriosa coisa é para ir, ou para rachar. Acho que já é tempo de acabar definitivamente com essas rachas que, em boa verdade, começam a deteriorar o ambiente e a permitir muitas infiltrações rachadas e perniciosas.

Parece que essa coisa vai consistir na consulta a uns tantos milhares de sujeitos, através da acção de carregar num botão, a fim de que, lá para a madrugada do dia seguinte se saiba quem ganhou o direito a substituir leite por chá, cerveja ou laranjada. Tudo indica que a substituição se processará com a facilidade com que se bebe uma imperial.

Isto porque o chá está mesmo fora de questão, pois já consta que não há chá preto e o chá branco não reúne um mínimo de gostos refinados que queiram enfiá-lo pela garganta abaixo. Quanto à laranjada, com promessas de mistura com umas bananas madeirenses, depois de tudo bem passado, dizem que continuará a ser uma bebida demasiado espessa, mais compatível com o prato e a colher, em lugar do tradicional copo de sumo.

Com todas as probabilidades de seguir mesmo em frente, numa madrugada de securas várias, está a cerveja, a ditosa imperial que vai, mas não racha, com tudo preparado para que, o racha tudo, se dê lá mais para diante. No entanto, nisto de rachar, quando não vai no momento, a coisa pode complicar-se com o decorrer do tempo.

Até porque ninguém acredita que, de um momento para o outro, toda a gente abandone definitivamente o chá e a laranjada, para lá do leitinho que já ficou para trás, definitivamente ou não, para começar a virar imperiais com ou sem o respectivo pires de tremoços ou o prato de camarões bem temperadinhos.

Uma coisa é o que se deita da boca para fora em momentos de pré euforia, talvez até de pré convencimento de que o poder já está no papo, outra coisa bem diferente são as pressões incontornáveis dos interesses bem disseminados e representados por constantes armadilhas que, ao contrário do que muita gente julga, não se armam apenas nos corredores do poder.

Mas, amanhã, a coisa ou vai ou racha. E a coisa é simples de mais. É apenas o resultado do acto de milhares de pressões em botões que certamente vão representar o fim da macacada que já dura há uma data de anos em que, além de leite, chá, café, laranjada e cerveja, até apareceu um castanheiro que, tudo o indica, nem vai entrar na castanha que se pode seguir ao acto, que até pode acabar com toda a gente a pedir uma imperial à maneira.

No meio de toda esta filosofia barata, como já foi dito pelo defensor do chazinho, o filósofo que se cuide, pois todas as misturas são possíveis e, embora com muitas reservas, é sempre possível bater tudo num agitado vaso misturador, esperando pelo encher das taças comemorativas do êxito e do entendimento.

O perigo maior desta operação triunfo é haver amanhã demasiada gente a optar pela imperial, a única de todas as bebidas em competição, que lá tem o seu grau alcoólico mais ou menos acentuado. Então aí, corre-se o risco real e verdadeiro de alguns excessos antes de tempo, ainda que, na ressaca, se abuse depois do café sem açúcar, ou mesmo do chazinho de cidreira, que dizem ter poderes muito digestivos.

No meu prognóstico de depois do jogo, prevejo que, como dantes, a coisa nem vai nem racha.

 

Assim, de caras, quem deve ser multado é quem faz asneira da grossa. Por exemplo, se eu resolvesse conduzir o meu veículo à velocidade de duzentos à hora, se ele os desse, claro, é evidente que seria eu o multado, e bem multado, e não o inocente instrutor que me ensinou a conduzir dentro das normas estipuladas pela lei.

Mas, infelizmente, nem sempre acontece assim e acaba por ser multado quem não teve nada a ver com a infracção em causa, nem está na sua mão poder preveni-la ou reprimi-la. O caso mais flagrante que me ocorre neste momento, dada a sua actualidade, é o que se passa nos domínios do futebol, ou melhor, na violência fora dos estádios de futebol.

Gostava que alguém me explicasse o que têm a ver os clubes com a violência praticada por indivíduos dentro de autocarros ou de carros particulares que se deslocam em auto-estradas, ou se dão aos piores desvarios em áreas de serviço, portagens ou mesmo nas proximidades dos estádios de futebol.

Gostava que alguém me explicasse porque motivo as autoridades de segurança assistem a tudo isso, muitas vezes impotentes, devido à força bruta desses energúmenos, acompanham-nos durante centenas de quilómetros e durante muitas horas ao longo do dia e, no final, não se responsabilizou ninguém, não há ninguém que pague os prejuízos causados e os ferimentos mais ou menos graves ocorridos nos polícias e nos vândalos.

Passados alguns dias, lá vem alguém mostrar que tem a mão pesada e aplica multas aos clubes de que julga serem os adeptos envolvidos. Ora aqui é que está o busílis da questão. Se as autoridades policiais não quiseram, ou não puderam controlar essa cambada, que podiam ter feito os clubes que não foram para ali tidos nem achados?

Mesmo considerando que os responsáveis por esses clubes são culpados de muita violência gerada pelos seus comportamentos incendiários, criando mesmo ambientes explosivos que desencadeiam reacções imprevisíveis numa escalada que parece ser cada vez mais incontrolada, não faz qualquer sentido culpá-los, deixando os energúmenos a rir-se.

Mas isso, cabe às entidades que têm por incumbência regular e regulamentar as actividades desportivas, metendo os infractores na ordem através de castigos justos, e não andar a tentar dividir o mal pelas aldeias, para não provocar descontentamentos clubistas de que não são capazes de despirem as suas próprias camisolas.

Quando se multa um clube, tem de imediato de se arranjar outra vítima, senão lá tínhamos o caldo entornado com os tais dirigentes a deitar gasolina para a fogueira. Portanto, castiga-se sempre aos pares, para que ninguém se excite ainda mais. E, se a excitação for traduzida em palavras críticas dirigidas à classe dos maiorais das ligas, lá se arranja mais uma multa para serenar os ânimos.

Ora é lógico que, se os clubes não deviam ser responsabilizados por aquela violência, e se os vândalos gozam do privilégio de ser o que são, alguém devia ser responsabilizado pelo actos que prejudicam tanta gente. Esse alguém devia ser, em primeiríssimo lugar, o representante do governo para o desporto que, actualmente, até tem físico para dar e levar.   

Mas, em tudo o que é bola, há uma complacência evidente, pelo menos para mim, que nem costumo ver coisas que mais ninguém vê, complacência essa que abrange tudo o que de mau se passa a norte, em contraste com uma certa severidade em relação a ocorrências semelhantes passadas de Coimbra para baixo.

Ainda há dias ouvi dizer ao primeiro-ministro do país que desejava que este fosse o ano do clube dele, que está sediado cá em baixo. Como dizem que ele manipula tudo e todos, admira-me muito que não acabe com a pouca vergonha que dizem que prejudica sempre o clube dele. Há aqui qualquer coisa que não bate certo.

Por outro lado, muitos dos ministros e o tal responsável pelo desporto, são oriundos lá de cima e sabe-se que têm outra cor clubista da do primeiro-ministro. Não sou muito forte em deduções, mas nesta, julgo deduzir bem, que os ministros e o secretário do desporto, andam a fazer pirraça ao chefe do governo.

Depois, para compor o ramalhete, ainda há os federativos e os ‘ligueiros’, cuja maioria dos dirigentes são autênticos paus mandados de alguém, que nem sequer se esconde na sombra, pois conseguindo andar à chuva sem se molhar, também consegue dar nas vistas, como se nunca fosse visto.  

Portanto, quem devia ser multado, eram os tais governantes e os tais dirigentes federativos e ‘ligueiros’, que enchem os respectivos cofres com as multas pagas por quem não tem culpa nenhuma de que não acabem as conveniências que tanto lucro lhes dão.

 

 

Ainda não há mas lá chegará o tempo em que algumas das muitas lojas de artigos chineses instaladas em Portugal, nos apresentem como novidade, um tipo de piloto chinês, que ainda não sei bem como será mas, com toda a certeza, vai ser muito diferente dos pilotos portugueses, que tantas dores de cabeça estão a dar a tanta gente.

O meu raciocínio vai na sentido de que não é difícil encontrarmos de tudo nessas lojas ao preço da chuva. Dir-me-ão que deve ser ao preço da chuva de inverno, quando ela é demais e não serve para nada, senão para estragar muita coisa. É verdade, mas há quem goste. Da chuva, de qualquer chuva, como de qualquer coisa das lojas dos chineses.

No dia em que cheguem cá os pilotos chineses aposto que lhes vão logo perguntar quanto tempo é que eles estão dispostos a voar para receberem o valor de um ordenado mensal de um piloto português. A pergunta tem toda a oportunidade, pois sabemos que em diversas profissões, só falta que os chineses paguem para trabalhar.

Já estou a imaginar a resposta do piloto chinês. Depois de fazer umas contas de cabeça por causa das despesas de dormida e de uns trocos para a comida, sabendo já que a farda é de borla, o piloto, como que num desabafo, disse muito claramente que trabalhava um ano inteiro, doze meses, salientou, recebendo o valor do tal ordenado mensal do piloto português.

Depois de uma pausa um tanto intrigante, o piloto chinês ainda acrescentaria, com um sorriso de orelha a orelha, que nesse custo estava incluído o avião, que ele também mandaria vir da China. Por mim, não vou fazer qualquer comentário sobre a proposta, porque não conheço o piloto e muito menos o avião chinês que ele se prontificava a fornecer.

Mas, vale a pena reflectir um pouco sobre esta matéria. Os pilotos portugueses estariam contra, provavelmente, porque diriam que, avião chinês, com piloto chinês e combustível nacional, seria ruinoso para a nossa economia, acrescentando que o negócio só seria susceptível de aceitação, se o piloto chinês também fornecesse a gasosa.

O sindicato dos pilotos diria de imediato que nem pensar, com combustível ou sem ele, uma vez que o piloto chinês não estava sindicalizado em Portugal, nem nunca seria aceite a sua admissão, pois não era sério que o piloto chinês trabalhasse doze meses, sem um mês de férias, sem subsídio de férias e sem décimo terceiro mês.       

Por outro lado, as centrais sindicais opor-se-iam terminantemente à vinda de pilotos chineses, que mais não fosse, porque isso provocaria, quase de certeza, uma redução de postos de trabalho nacional em favor de estrangeiros, com a consequente perda de poder de compra dos pilotos portugueses que, dessa maneira, veriam desrespeitado o princípio de que não poderiam perder direitos adquiridos.

O povo português, de um modo geral, ficaria revoltado, alegando que, se proibiam a vinda de pilotos chineses, muito mais baratos que os nossos, qualquer dia começavam a cortar nos artigos das lojas dos chineses, por causa dos produtos portugueses.

Mas, quem mais se indignaria era a classe comercial que, na falta de produto de fabrico nacional, vai aos chineses abastecer-se para não ter de fechar a porta da loja. Porque dizem que só não fecham mesmo, para ajudar a equilibrar o défice do falatório nacional, tão discutido e tão comentado nas suas lojinhas de convívio social.

O estado já deixou bem claro que defende tudo o que é caro, mesmo muito caro, aos bolsos dos portugueses. Portanto, pilotos chineses só em último recurso, como seria o caso de os aviões portugueses ficarem todos avariados, ou os pilotos portugueses começarem também a variar. Aí, sem dúvida, pilotos chineses, com aviões chineses.

Neste caso, o estado contaria com a compreensão, e até o aplauso de toda a sociedade civil, nestes conflitos em que o mais importante nem é o dinheiro. O estado não liga a essas coisas. Também, alguma vez, a sociedade civil, havia de estar do lado do estado. 

 

 

 

Até no tempo da ditadura a oposição, registe-se que clandestina, era bem mais coerente e digna do que é hoje, apesar de estar sujeita a levar nas orelhas quando os seus membros eram identificados. Nessa altura queixavam-se menos e sofriam bem mais, enquanto agora se queixam demais sem que nada lhes tenha acontecido de mal.
Naquela altura não podiam falar mas entendiam-se bem, mesmo para lá das escuras celas onde a única droga que lá entrava eram os instrumentos de tortura levados pelos guardas que não tinham partido, mas partiam tudo aos reclusos com as suas atrocidades. Hoje, a oposição queixa-se de falta de tudo, mas só pode queixar-se das suas insuficiências e da falta de se fazer acreditar.
Já não há a mínima preocupação de tentar mostrar que se fala com argumentos aceitáveis e minimamente credíveis, atirando-se para o ar um sem número de atoardas que só as pessoas realmente apanhadas pela cegueira da partidarite aguda, ou da simpatia elevada ao expoente máximo da doença, podem aceitar sem um sorriso amargo de desânimo.
Pelo contrário, quanto maior for a bernarda, mais gozo ela provoca nos seus entusiastas, como se estivessem convictos de que é assim que se ganham simpatias e é assim que se ganham batalhas eleitorais, como se todos os eleitores alinhassem nessa parvoíce igual ao gozo de bater com as cabeças nas paredes.
É sabido que todas as parvoíces provocam rombos, nomeadamente nas cabeças, mesmo quando se pensa que elas são mais duras do que as ideias que têm dentro delas. Normalmente, não é por essa via que se fazem conquistas, mas é por aí que se constroem grandes derrotas que, depois delas, obrigam a levar as mãos à cabeça.
A oposição sabe que precisa de tirar votos a quem ganhou anteriormente, mas nunca lhos tirará através de campanhas dúbias ou, pior ainda, de campanhas que se vão desmascarando a si próprias, devido à insustentabilidade das teses que morrem com o tempo, por assentarem em bases mais movediças que as areias do deserto.
Para roubar votos a quem está à frente, são precisas ideias claras e argumentos facilmente compreendidos, porque os votantes não são tão inteligentes que entendam as burrices que lhes querem impingir, nem são tão cegos que não distingam as mentiras e as verdades de quem têm na frente dos olhos, tão pouco são tão estúpidos quanto os julgam, ao não entenderem nada do que lhes dizem.
É por isso que me parece que temos a pior oposição de sempre. Porque a oposição também precisa de ter valores e projectos sérios que consiga impor pela sua validade e racionalidade, em lugar de se dedicar quase exclusivamente à má-língua e à procura de cantinhos onde se possa misturar e conviver com quem sabe que nunca se dará bem.
Antes das eleições os partidos acusam-se mutuamente de estarem a preparar alianças estranhas e contranatura. Depois das eleições, vemos como os acusadores se aliam a quem não gostavam que outros se aliassem. É uma roda livre de insensatez e de contradições, que só serve para fortalecer o poder, por mais fraco que ele seja.
Se a oposição é a pior de sempre no que respeita aos seus próprios interesses, já o mesmo não se poderá dizer em relação aos interesses de quem é atacado. Nunca o poder se manteve tão pouco desgastado ao longo de tanto tempo, ao contrário do que dizem os seus opositores, sequiosos de que os seus dislates produzam efeitos.
E isso não se deve às virtudes do poder que, em muitos aspectos, está longe de ter a simpatia de muitos cidadãos, em relação a determinadas medidas que toma. Mas recebe muita simpatia por estar permanentemente a ser atacado com argumentos que não convencem, beneficiando da antipatia que esses argumentos acumulam nos seus autores.
Esta oposição tem de convencer-se que não basta gritar – agarra que é ladrão! ... – É preciso que saiba primeiro o que é que foi roubado. Senão, não é tão cedo que vai roubar votos a quem já os ganhou antes.
 
20 Mar, 2010

Meio desemprego

 

Há quem diga que cerca de metade dos desempregados nunca estiveram disponíveis para mexer uma palha, o que quer dizer que esses inactivos contumazes nunca deveriam contar para os números que são fornecidos sobre a situação do desemprego, uma vez que eles querem tudo, menos trabalhar.
Por outro lado, cerca de metade dos trabalhadores no activo, com emprego certo e garantido, também querem tudo menos trabalhar, estando entre as suas preferências, as intermináveis discussões de quem faz mais e ganha menos ou, o que é mais frequente, quem ganha mais e faz muito menos, se é que faz alguma coisa.
Daqui se conclui que, se tivéssemos possibilidade de meter os cinquenta por cento de desempregados que querem trabalhar, no lugar dos cinquenta por cento de empregados no activo que não querem trabalhar, o país ficaria com cem por cento de trabalhadores efectivos e activos que, realmente, se dedicavam ao trabalho com o devido interesse.
Não é difícil imaginar o que daí resultava em produtividade e qualidade para os cidadãos que tanto se queixam da eficiência dos serviços, principalmente, os públicos, por serem aqueles onde o controlo e a vigilância da execução do trabalho são muito menores, já para não falar da menor qualidade da organização das tarefas, em relação ao sector privado.
Outra maneira de reduzir os desempregados a metade, era obrigar todos aqueles que recebem subsídios sem nada lhes ser pedido em troca, a prestar tarefas do tipo de serviços cívicos em locais públicos, ainda que de mera vigilância, com o fim de esclarecer, ou prestar simples aconselhamento, tornando alguns locais públicos menos caóticos para quem os utiliza menos vezes e os desconhece.  
Como é evidente, essa simples ocupação, levaria muitos dos subsidiados a desistir desses subsídios, por vários motivos mas, principalmente, porque teriam vergonha de se exporem publicamente a ficarem conhecidos como verdadeiros vigaristas encapotados, recebendo ilegalmente aquilo que tanta falta faz a quem realmente precisa.
Sei perfeitamente que seria preferível o estado criar empregos para essas tarefas, mas também sei que não é novidade para quem sabe onde vive e como se vive, que não bastam os chavões do costume para colocar o país assente em bases sólidas que permitam sair deste atoleiro, que todos reconhecem, mas muito poucos estão disponíveis para contribuir com o seu aval, no sentido de que a situação se modifique de vez.
Isto não significa estar a pretender dar apoio ou criticar, politicamente, seja lá em quem se esteja a pensar. Significa apenas e só, que o país algum dia vai ter que cortar a direito, à esquerda ou à direita, mas em frente deixando, de uma vez por todas, as questiúnculas que nos têm mantido na cauda de quase tudo. E onde parece que há quem se sinta muito bem.
Como já se ouviu a diversas personalidades com competência, com muito mais competência que aquela que não mostram muitos dos mal intencionados, ou mal preparados, toda a gente reconhece que quase tudo está mal, mas ninguém dá um pequenino passo em frente para ajudar a melhorar alguma coisa.
Pelo contrário, vemos cada um puxando a brasa à sua sardinha, remexendo no meio das cinzas apagadas, sem se aperceber que, afinal, ali já não há brasa nenhuma. Mas, cegamente ou não, exigem que a sua sardinha apareça prontinha a ser comida, só porque têm a barriguinha a dar horas, esquecendo outras barrigas cujo relógio parou há muito tempo.
Tal como os grandes endinheirados, também os bem empregados e os mal subsidiados, não querem contribuir com absolutamente nada, para que os excluídos e os incapazes ou inválidos sem recursos, tenham uma vida decente.
 
19 Mar, 2010

Que dia é hoje?

 

Para muitos, hoje é o dia seguinte à vitória do Benfica em Marselha, enquanto para outros ainda é dia de azia, tanto por causa dos anjinhos desses franceses de ontem, como por causa da desilusão de Alvalade e, sobretudo, por não terem podido dar uma boa sova nas costas do traidor Simão.
Pois, mas isso não é lá grande motivo para ser o dia da boa e da má bola, que foi ontem, nem tão pouco para ser o dia do PEC, que ainda está para vir, com todas as prendas que acabará por entregar na devida oportunidade. Estou certo que muitos portugueses estão mesmo muito ansiosos para que ele chegue, na expectativa de se verem livres definitivamente do perigoso stress em que andam enrolados de há uns tempos para cá.
Também não se pode dizer que hoje é dia do BPN, na medida em que ainda falta que nos digam muita coisa sobre os que também eram mas, agora, devem ter sido ocultados sob o manto diáfano da serena seriedade de algum amigo que nem sequer é dos malandros que estão na ordem do dia há que séculos. 
Também não é dia nacional da investigação, porque os investigadores resolveram investigar-se uns aos outros, na esperança de que consigam descobrir o raio da folha que não estava na folha de serviço de nenhum deles. Mas, o mais esquisito, é andarem tantos fora da folha de serviço, há tanto tempo, e nunca se tinham lembrado de se voltarem para esse lado, que é o lado oculto da questão.
Ainda me lembrei que hoje talvez pudesse ser o dia nacional da adopção, porque ouvi na rádio que um conhecido dirigente lá de ´chima’, da bola, pois do que é que havia de ser, resolveu adoptar uma miúda de vinte e três anos, bonita idade para uma adopção feliz, acrescentando eu, que nem sequer teve de esperar o tempo de adaptação, que as adopções de miúdos e miúdas levam com a burocracia.
Talvez não fosse má ideia comemorar hoje o dia nacional da ética, apesar de ninguém conseguir encontrar a mais pequena pista que indique, ainda que por pequenos indícios, por onde é que ela se terá sumido, sem deixar rasto no meio de tantos e tantas ‘eticeteras’ do nosso meio onde, politicamente, ela devia emergir como o sol da primavera que aí vem.
No dia de hoje, ainda não consegui ver um sinalzinho que se veja, de que seja o dia de qualquer um dos santos, Passos, Rangel, Aguiar ou Castanheira, tanto mais que já hoje ouvi um deles anunciar uma grande surpresa para o dia vinte seis, dia em que não poderá ser o seu dia, pois a data já está ocupada com o dia nacional da pobreza de espírito.
Como está bem de ver, não é o dia da oposição toda, pois o período fértil comum está muito perto, mas a calmaria destes dias próximos passados, deixa antever para os dias próximos futuros a marcação do dia D que será, finalmente, o dia da derrocada que se prevê comemorado com bombos e pandeiretas de todos os tamanhos.
Mas hoje também não é o dia do governo, até porque chove por todos os lados. Ora o governo, no seu dia, exige a S. Pedro um dia de sol, um dia luminoso, como a sua cara, como o seu passado, como será o seu futuro, que só não será de quatro anos, se lhe não der na veneta de ir pregar para outra galáxia.   
Sinceramente, já pensei em tantas hipóteses de comemoração para o dia de hoje, dezanove de Março, que resolvi dar por finda esta pesquisa infrutífera ao meu memorial desconfigurado, mas inconformado com tantos acontecimentos que bem mereciam ser hoje comemorados. Ah, agora me lembra mais um.
Ora digam lá se hoje não era um bom dia para se comemorar o dia dos filhos e das filhas que todos os anos se esquecem que têm um pai. Ou, em alternativa, podia comemorar-se o dia nacional do esquecimento, que é um dia em que muitos portugueses ganhariam um novo alento e muito ânimo para enfrentar o futuro.
Com todo este arrazoado lá me esqueci que dia é hoje, afinal.
 

 

 Há muito tempo que eu desconfiava que devia haver por ali uma liberdade qualquer, que não existia em nenhum outro partido. Tinha quase a certeza disso mas, com tantas vozes com o volume no máximo a contradizer-me, não tive outro remédio senão ir-me conformando com tantas dúvidas reprimidas no fundo da garganta a rebentar pelas costuras.
Num partido com a liberdade de levantar dúvidas sobre toda e qualquer liberdade de expressão, sobre toda e qualquer liberdade de compressão, de impressão, de retaliação, de indignação, de reprovação, de má educação, de contra informação e de invenção, não fazia sentido que não houvesse só mais uma liberdade, a liberdade de supressão.
É que essa tem a prerrogativa essencial e necessária a qualquer liberdade que muito dignifica quem adora submeter-se a todas as liberdades. Não só submeter-se, mas intrometer-se em todas as liberdades, suprimindo a voz de quem não aceite a liberdade de se manter calado perante a voz inatacável do chefe do partido.
É a liberdade de supressão do direito à claustrofobia demográfica, tornando assim esse partido num pilar de verticalidade suprimida, de rolha roída, de palavra contida, de opinião oprimida, de vontade reprimida e de democracia escondida. Pior que isso, só o que se passa com quem se atreve a passar pelo Largo do Rato, onde os supressores de agora, já condenavam há muito tempo, o rato que roía a rolha da garrafa.
Temos assim que, a partir de agora, com a liberdade de supressão, o tal partido deixa de ter o argumento de que não há liberdade de expressão, permitindo ao controlador dessas coisas, ficar liberto de qualquer obrigação de respeitar a falta de toda e qualquer liberdade. É que a liberdade é como o sol que, quando nasce, é para todos. Mas quando se põe, também é para que todos fechem os olhos e vão dormir descansadinhos.  
Não precisam de pedir desculpa a ninguém, mas podem recuar à vontadinha na trabalheira que poupam aos deputados e ao pessoal da assembleia, assim como ao país em termos de massinhas, se fizerem uma supressão da liberdade de desconfiança, com a qual se elevaria muito, o nível de supressão de bagunças e de invasões de outras instâncias, igualmente em risco de algumas supressões, por indecente e má figura.    
Fica agora provado e mais que provado, confirmado e reconfirmado que, por maioria não absoluta, foi considerado que a supressão da liberdade é muito mais importante que a liberdade de expressão, tão vilmente execrada e atacada nos seus fundamentos infundados, pelos fundadores deste novo conceito de suprimir agora, aquilo que tanto adoravam ainda há bem poucos dias.
Podem crer que eu não estou muito preocupado com as supressões e as suas liberdades, visto que já estou habituado a suprimir muitas das deambulações do meu pensamento, ainda muito mais irrequieto e revolucionário que o daqueles supressores de última hora. Portanto, antes de eles começarem a suprimir, já eu suprimia muita coisa a mim próprio. E que coisas.
Apesar de não concordar, nem aceitar, nem querer as supressões que os outros querem, até nem me importava de ser eu a determinar umas tantas supressões, que calhavam bem com a maneira como eu vejo certas coisas, que ninguém é capaz de suprimir. Só que me falta a liberdade para a acção.
Ainda hei-de pedir a este partido da supressão da liberdade, ou a outro qualquer, que me arranje lá essa liberdade, que eu depois trato do resto. Havia de ser bonito.
 
 
 
 

Pág. 1/3