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afonsonunes

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29 Abr, 2010

S & P Limitada

Hoje não me apetece mesmo nada dedicar o meu precioso espaço ao Standar e ao Poor, o já célebre S & P, por muito ódio que tenha aos dois, desde que me entraram nos bolsos, de há uns dias a esta parte. Até me permitia aconselhar todos os portugueses a exigir-lhes um pedido formal de desculpas por se terem permitido um tal abuso de confiança.

Em última análise, quero que se lixem esses gajos, porque hoje estou mais virado para outra companhia limitada, esta formada por dois cidadãos lusos, por acaso ambos lá de cima, que tiveram a infeliz ideia de adoptarem as mesmas letras dos já citados, para se identificarem. Acredito piamente que se trata de uma infeliz coincidência, mas constato-a.

Concretizando, trata-se da firma constituída entre Sócrates e Passos (S & P Limitada), que teve o seu registo oficial um dia destes, ali para os lados de S. Bento, num final de manhã, em que se fez sentir uma forte e inesperada trovoada, gerada por uma triste depressão de cacau, vinda de ocidente em velocidade vertiginosa.  

Ambos os fundadores de tão inesperada companhia, parece que foi tão inesperada como bem-vinda, se mostraram bastante determinados em garantir o sucesso que, à partida, até parece uma coisa do outro mundo, tendo em conta os relâmpagos bem recentes, que haviam incendiado as bases desse acordo tido como impossível.

Está visto que, por cá, já nada é impossível. Depois de o objectivo de Passos, único e imprescindível de poucos dias antes ser precisamente derrubar Sócrates, eis que, agora, esse objectivo foi reclassificado para, não deixar cair Sócrates, enquanto Passos não cair com ele.

O gesto de Passos é bonito e é, sobretudo, muito generoso, depois de tanta guerra que não se sabe ainda se já teve a assinatura de armistício competente ou se, daqui a uns dias, alguém se diz não vinculado a tão esperançoso momento da criação da S & P Limitada. Sim, porque já estamos habituados a que tudo seja mesmo muito limitado.

À primeira vista, isto parece-me um pouco aquele slogan que diz, se não os puderes vencer, junta-te a eles. Mas, também há quem diga que, afinal, assumir a gerência, sozinho, de uma companhia falida, não dá para o ‘pitrol’, portanto, é melhor ir vendo como é a dois, a ver se a companhia se torna, entretanto, suficientemente apetitosa e apetecível.

Depois, também já ouvi dizer que, com o nascimento feliz, para alguns, mesmo muito feliz, da S & P Limitada, se juntou a fome com a vontade de comer. E eu, como já vi tanta coisa, atrevo-me a dizer baixinho, para que não digam que eu sou tão bota abaixo como tantos outros, atrevo-me, repito, a dizer que ainda não posso afirmar quem é que vai ser comido, nesta recém-nascida companhia.

Pelo sim, pelo não, acho que se devia fazer um referendo para o povinho se pronunciar sobre os fundamentos desta singular companhia, que mais não seja porque vai dedicar-se, essencialmente, ao corte. Os que cortam vão, certamente, votar em massa no sim. Mas, os cortados, que se prevê seja uma maioria desconfortável, não deixarão de votar não, já que ficam mesmo sem massa nenhuma.

Há aqui um outro pormenor muito importante. É que o referendo tem de ser autorizado e aprovado por quem de direito. O grande problema é que quem deve falar nas alturas de grandes decisões, normalmente, diz que deve estar calado. Mas já tenho ouvido dizer que há alturas em que fala muito, quando devia estar calado.

Tenho cá um pressentimento que esta companhia ainda acaba por ser alargada. A ver vamos se a S & P, Limitada, não passa, em breve, a S, P & C, Ilimitada, a fim de ter um elemento permanentemente atento e sorridente, essencial para que o negócio seja a sério.

 

28 Abr, 2010

juro que menti

 

Tenho perfeita consciência que pus o país em alvoroço ao anunciar com toda a pompa e circunstância que seria eu o próximo presidente da república. Como todos os portugueses sabem perfeitamente que eu nunca minto, foi inevitável esta onda de manifestações de apoio incondicional em que me vi envolvido.

Porém, quando acordei e me apercebi de que estava no meio da tempestade, tentei de imediato colocar os pontos nos ii mas, não sei bem como, já toda a gente sabia do meu sonho lindo e depressa compreendi que era tarde demais para apagá-lo. Não havia água nem espuma nem gesto mágico que o fizessem evaporar-se.

Ainda jurei por todos os santinhos que tinha mentido, mas ninguém foi nessa. Houve logo quem me repreendesse ferozmente, afirmando convictamente que era impossível ter mentido. Porquê? Porque nunca se viu ninguém mentir enquanto sonhava, desde que estivesse a dormir.

Sim, porque há quem sonhe acordado, mas não foi o meu caso. E lá fiquei entalado no meio de um sonho e de uma mentira, completamente incapaz de provar que tinha mesmo mentido. Mas, que culpa tenho eu que queiram à viva força que eu diga que não menti? Tudo isto porque enfiaram lá na deles que eu nunca poderia ser um mentiroso vulgar.

A partir daí caíram em cima de mim com as mais indecorosas provas de que era impossível eu ter mentido. Um dos meus amigos logo me atirou à cara que tinha a certeza de que eu estava a tentar fazer-me passar pelo governante que já bateu todos os recordes de auto acusações. Aquele que está exausto de dizer que mentiu, que nunca disse uma única verdade, e toda a gente diz que não. Ora, não haverá aqui uma outra maneira de mentir?

Mesmo assim, juro que menti, apesar do meu melhor inimigo já me ter mandado uma mensagem via telemóvel, dizendo que ficaria muito chateado comigo, se eu insistisse nessa balela, ameaçando-me com um inquérito sumaríssimo se não arrepiasse caminho. É fácil de perceber a triste situação em que me estão a envolver, só porque quero mesmo ser mentiroso declarado.

Tudo isto parece um desejo esquisito da minha parte, mesmo a tender para o inexplicável, mas não é. Até se pode resumir em poucas palavras. Estou farto de não pregar uma mentirinha como toda a gente faz. Estou mesmo farto de não ser como as outras pessoas vulgares, pois eu adoro a vulgaridade. E o vulgar é mentir.

Ora, se toda a gente mente, porque raio de razão têm de estar sempre à espera que eu seja o único verdadeiro neste mundo de mentiras? Estou mesmo tentado a dizer que já fui felicitado pelo presidente em comício e pelo primeiro em desperdício, através de mensageiros de viva voz, por causa das escutas, ambos vivamente satisfeitos pelas minhas novas funções a assumir em breve.

Sempre quero ver até que ponto continuam a dizer que eu não minto. Mas eu juro que estou a mentir. O problema é que ninguém acredita em mim. Não, não sou um infeliz por isso. Era só o que faltava, pois já me têm dito que com a verdade vos engano.

Por isso cá vou mentindo à minha maneira.

 

    

 

26 Abr, 2010

Os super fiscais

Só conheço duas espécies de cidadãos que não estão sujeitos a qualquer tipo de leis, ou que sejam responsabilizados pelo que fazem e pelo que dizem, contrariamente ao que acontece com todas as outras pessoas que têm sempre a justiça em cima, muitas vezes ainda antes de abrir a boca ou levantar um dedo no sentido de pretender fazer algo.

Já me interroguei muitas vezes sobre o porquê desta incompreensível situação, mas ainda não obtive uma única resposta. Estou prestes a concluir que deve ser o meu intelecto que não dá para mais. Mas, se assim for, pergunto-me mais uma vez porque será que ainda não descobri ninguém mais esperto que eu, que se antecipe a responder às minhas perguntas?

Como já tenho ouvido dizer que o sol quando nasce é para todos, pensava que, do mesmo modo, todos estavam obrigados a respeitar os mesmos princípios e a não praticar as mesmas asneiras. E pensava também que uma asneira é sempre uma asneira, isto é, continuo a pensar que, sempre que um asno abre a boca, é certo que saiu uma asneira.

Os meus pensamentos andam mesmo pela hora da morte. Porque a primeira espécie de cidadãos que tem o privilégio de ‘asneirar’ sem que daí lhe venha qualquer problema, são os caça fantasmas, fantasmas que eles inventaram, que insistem que há, que viram, e até são capazes de jurar pela vida sabe-se lá de quem.

Alguns até dizem que são jornalistas, coisa que não entra cá na minha moleirinha, mesmo sabendo que têm sempre uns fiéis seguidores que até são capazes de jurar que eles são deuses que foram encarregados por um deus supremo, de fazer justiça divina neste mundo. Daí que estejam inebriados por essa visão celestial que lhes tolda a vista neste reino terráqueo.

A outra espécie de cidadãos a quem ninguém pode pedir responsabilidades pelas asneiras que dizem e males que provocam, são uma boa parte dos deputados, ditos representantes dos seus eleitores, coisa que custa a encaixar na minha já citada moleirinha. Sim, porque não acredito que alguém com ela no sítio, aceite pensar como eles, excepto os seus inspiradores e chefes de fila.

 Alguns deles acumulam tal variedade de tachos, que são prova de uma cultura profissional muito diversificada, não se compreendendo porque são tão dados à asneira na apreciação de casos simples e de compreensão comum, como se tivessem palas na cabeça a dirigir-lhes o discernimento no sentido único da dita.

Os citados inventores de casos e estes deputados de compreensão acima da média, têm por missão, uma delas, claro, desempenhar o ingrato papel de super fiscais de toda a gente sem, contudo, ninguém conhecer quem lhes deve fiscalizar as suas delicadíssimas actividades. Mesmo quando se dão ao luxo e à clarividência de ‘asneirar’ descaradamente.

Dizem que são poderes independentes. Mas têm o privilégio de se meterem com outros poderes igualmente independentes. Se podem entrar na independência de outros poderes, é lógico que aceitem que haja reciprocidade de procedimentos, sujeitando-se à competência devida àqueles que pretendem subordinar. 

É o caso das comissões de inquérito que pretendem antecipar-se à justiça, exigindo todos os elementos de investigação que esta tem em seu poder, para poder julgar antes dela. Parece-me de todo aceitável, que a justiça também possa chamar a depor os deputados que metem o pé na argola, bem como os seus chefes, e os inventores de coisas que nunca aconteceram, ou seja, os já citados caça fantasmas.

Sugiro pois, que todos os poderes independentes possam abrir inquéritos, e sugeria também, desde já, que o primeiro desses inquéritos averiguasse, no âmbito do poder judicial, porque razão o Dr. Oliveira e Costa não respondeu perante os deputados que o chamaram a depor, sendo então entendido que tinha direito ao silêncio.

Por outro lado, o Dr. Rui Soares, também chamado a depor, não só não tem direito ao silêncio, como ainda é alvo de uma queixa-crime por desobediência qualificada.

É claro que são coisas completamente diferentes. Pois são. Um é do PS, o outro é do PSD. Muito importante. Um provocou um rombo de milhões que meteu em casa dele e dos amigos que, por acaso, parece que nenhum deles era do PS, enquanto o outro pensou num negócio que não chegou a realizar. Isto, sim, é um crime horrendo, e se ele concretizasse esse negócio, teríamos de voltar à pena de morte para que a justiça fosse realmente justa.

São esses deputados e os caça fantasmas, que falam a toda a hora na verdade, mas nunca quiseram saber a verdade das escutas a Belém, lembram-se? Pois eu até me lembro que toda a gente já esqueceu, a verdade de um honesto e consciencioso assessor do presidente, que não teve o azar de se ver envolvido na mais pequena fuga, tal como ninguém lhe chama nomes engraçados vivendo, por isso, perfeitamente calmo e tranquilo. Claro que, como ele, há muitos outros companheiros e amigos. Olha se fossem camaradas…

Há muito tempo que sei que na política não há anjinhos. Mas não queiram que nós sejamos os anjinhos que eles não são. Daí que, hoje, o sectário sou eu. Também tenho esse direito, apesar do sorriso amarelo dos sectários super fiscais.

 

Os oficiais das Forças Armadas que planearam o 25 de Abril tiveram muito bom gosto nas opções que tomaram, no sentido de transmitirem ao povo português, um sentimento de confiança e respeito por valores até aí praticamente desconhecidos, pois tudo o que se fazia nunca tinha em vista o benefício desse mesmo povo.

De bom gosto foi a escolha dos cravos vermelhos para enfiar nos canos das espingardas. Podiam ter escolhido rosas vermelhas, amarelas ou alaranjadas, tal como podiam ter decorado esses canos com foices ou blocos de qualquer coisa. Não, os cravos ainda não eram de ninguém, mas eram já uma esperança de paz, fraternidade e justiça.

De bom gosto foi a escolha da Grândola Vila Morena para o arranque da caminhada para a liberdade, porque essa canção é um hino ao povo, é uma esperança de vida nova, é um cântico de vozes que caminham rumo ao futuro. Digo é, e não foi, porque ainda hoje apetece cantar essa canção com a mesma esperança de então, pois continuamos à espera de muita coisa que já devia ter chegado, mas não chegou.

São apenas dois aspectos do bom gosto dos jovens oficiais, para dizer que houve muito cuidado em evitar que actos de mau gosto pusessem em causa um acontecimento tão arriscado como perigoso, e bem sabemos como há sempre quem tenha mau gosto e uma tendência doentia para estragar tudo o que se pretende fazer de bom.

Parece que não é preciso analisar muito do que se passou nestes anos todos de pós revolução, para nos depararmos perante a evidência dos que têm lutado pelo espírito inicial, que eu considero que têm sido muito poucos, e aqueles que viram imediatamente, mil e uma oportunidades para se transformarem em pequenos ou grandes nababos, e estes, sim, foram muitos e fizeram-se muito poderosos.

Já lá vão trinta e seis anos e, infelizmente, de ano para ano, o espírito do vinte e cinco de Abril definha, como vão definhando os cravos vermelhos, como vai deixando de se ouvir a Grândola Vila Morena, fora destes dias em que ainda há quem comemore, quanta hipocrisia vai por aí, esse acontecimento já longínquo no tempo e mais ainda na memória de muita gente.

Não vale a pena perguntar porquê, mas quem se abotoou com alguma coisa que fez com que tenha hoje o que nunca devia ter tido, justifica o desânimo de quem devia ter essa parte que teve destino abusivo.

Mas, o mais irritante de tudo isto, é que quem mais detesta o vinte e cinco de Abril, são muitos desses que se abotoaram à má fila, enquanto quem festeja com mais entusiasmo, são uma parte daqueles que tinham todos os motivos mais um, para se enfiarem em casa.

Vinte e cinco de Abril, sempre, porque o povo ficou a saber quem lhe tira o pão da boca, ficou a saber que tem mais força quando se levanta, mesmo depois de o terem derrubado. Mas, o povo sabe que andam muitos falsos populares no meio dele, para lhe surripiar o pouco que lhe chega às mãos.

O povo sabe já hoje que não é quem muito fala nele que mais se preocupa com ele. O povo já não é um rebanho de carneirinhos como já foi outrora porque, entretanto, já o tosquiaram tanta vez, que a lã se foi definitivamente. Se hoje ainda há rebanhos e carneirinhos, uns e outros já não são o povo, mas uns burocratas a quem só faltam os chocalhos pendurados no pescoço.

Vinte e cinco de Abril, sempre, mas que se tirem dele todos aqueles que lhe desvirtuaram o espírito e o converteram em mais um logro onde impera a falsa liberdade e a falsa solidariedade, sim, que se tirem dele esses traidores do povo, para que vençam os verdadeiros cravos vermelhos e se oiça de novo, alto e bom som, a Grândola Vila Morena e se enterrem de vez todas as espécies de demagogia e de atentados à dignidade de todos os cidadãos.

Cravos vermelhos, sempre.

 

20 Abr, 2010

Hora e meia

É exactamente esse o tempo regulamentar que dura um qualquer encontro de futebol embora, depois, o homem do apito tenha a prerrogativa de conceder mais uns minutinhos de esperança para quem não esteja a ganhar. Mas, não é da bola que o cidadão comum enche o papo, ainda que ela lhe dê fartotes de conversa para a semana inteira.

Hoje, porém, fui programado noutra direcção. Ao ver a insistência com que se referiu o facto de um encontro muito especial de apresentação de cumprimentos ter demorado cerca de hora e meia, logo me lembrei dos encontros com tempo de compensação, lá vem a bola novamente, em que por vezes se decide o resultado final.

Sinceramente não posso afirmar que o acontecimento teve tempo de compensação, mas teve muito tempo, certamente, em que duas mãos estiveram apertadas. E ainda deve ter sobrado tempo suficiente para que esse aperto se alargasse às quatro mãos, num sinal claro de que amizade e simpatia ainda são valores vivos em determinadas circunstâncias.

Por exemplo, quando se torna necessário repensar estratégias não totalmente coincidentes, em que essa hora e meia se pode considerar tempo insuficiente, mesmo aproveitando a agilidade de quatro mãos em perfeito esforço de cumprimento de um objectivo que, devido ao tempo passado, ainda só estava no domínio de duas dessas quatro mãos.

Depois, não podemos esquecer que é corrente haver nessas cerimónias mais uns tantos amigos de ambos os lados que, no caso, são todos amigos, e se pronunciam através de pormenores que só servem para atrapalhar, esquecendo eles que, como ouvi dizer há dias, quem não atrapalhar, já está a ajudar bastante.

Daí que, ao contrário de todas as estranhezas que ouvi, no sentido de que hora e meia era tempo excessivo para se apertarem duas ou quatro mãos, não têm qualquer justificação, pois as coisas nem sempre são tão simples como parecem à primeira vista. Até porque já estamos habituados a que, em tudo, se fale demais antes do tempo.

Aliás, para todos aqueles que estranham tudo e mais alguma coisa, sugeria que experimentassem fazer qualquer coisa de útil em hora e meia. Lembrem-se que são apenas noventa minutos, que até podem dividir em duas partes de quarenta e cinco cada. Mais, se forem daqueles que lhes doem as costas, façam um intervalo de dez ou quinze minutos entre a primeira e a segunda parte.

Vão ver que não custa nada, tenho mesmo a certeza que é muito mais simples e fácil que passar o dia inteiro nesse bolorento faz que faz mas não faz, que é exactamente igual ao diz que diz mas não diz. Esqueci-me de acrescentar ao faz e ao diz aquela palavrinha simples, mas muito importante que é, nada.

A propósito, lembrei-me agora que em hora e meia de encontro de cumprimentos, também se pode sair dela com algo de palpável nas mãos, mas não acredito nessa distante e improvável hipótese, visto que os cumprimentadores sabem perfeitamente que ao apertar as mãos, não devem exagerar, isto é, não se devem magoar, por exemplo, fazendo incómodas nódoas negras nas ditas.

O tempo, que é o mais competente mestre da vida, dirá muito claramente se essa hora e meia foi, ou não, bem aproveitada.

 

18 Abr, 2010

Marcha lenta

Acho muita piada às marchas lentas nas auto-estradas que são, precisamente, para ser percorridas em marcha veloz, através do pé pesado sobre o acelerador. Estes lentos, é quase certo que, fora das auto-estradas, onde deviam ser mesmo lentos, aceleram que nem uns tontinhos, coisa que eles julgam que não são mesmo.

Cá para mim, lentos de raciocínio são os que usam a lentidão para protestar, seja lá onde for, pois certamente que ainda não fizeram contas ao combustível que os seus carros gastam em regime lento, fazendo quilómetros e mais quilómetros, só para terem o prazer de buzinar contra quem nem sequer está a ouvi-los.

É certo que eles contam com as televisões para lhes dar a sensação de que, assim, toda a gente vai ligar muita importância a uma coisa que, em muitos casos, só conduz a que as televisões sejam desligadas, principalmente, por todos aqueles que ainda não têm carro, e por todos aqueles que pensam que nunca o poderão ter.

Depois há aqueles que sabem quanto lhes custa largar a preciosa massa para uns litritos de gasosa para ir trabalhar, não compreendendo quem tanto se queixa que o preço dela é uma exorbitância e depois ande a desperdiçá-la daquela maneira inglória. Dá vontade de dizer que, para esses, devia haver um preço extra especial.

No meu modesto entender esses protestantes deviam antecipadamente fazer uma sondagem, ainda que muito discreta, a um membro do governo, no sentido de saberem se poderiam ter alguma esperança de que a marcha lenta produziria os efeitos desejados. Se deparassem com umas reticências, que é como quem diz, umas hesitações, então era de ir para a frente e em força.      

Se, pelo contrário, essa sondagem fosse considerada objectivamente uma pressão ilegítima, então aí havia que recuar de imediato na táctica e, em lugar da marcha lenta, deviam avançar rapidamente com uma marcha a duzentos à hora, para que nem a polícia os pudesse acompanhar ou mandar parar.

Assim é que se via quem é que tinha maior força e determinação, se os marchantes endinheirados, se o governo teso que nem um carapau seco ao sol da Nazaré. Sim, porque em marcha lenta, há muitos automobilistas que desligam o carro nas descidas, o que é batota nítida no combustível que, assim, prejudica o estado nos impostos.

A marcha a duzentos à hora tinha a grande vantagem de não prejudicar os utilizadores normais das auto-estradas, aqueles que vão nas calmas e seriam ultrapassados pelos marchantes com toda a naturalidade.

Assim, sim, estes dariam um sinal claro e inequívoco ao governo, de que estão em condições de gastar o combustível que for preciso, fazendo o governo ponderar bem, se pode prescindir de tão bons pagadores de impostos através do consumo desse precioso combustível.

É por isso que quem protesta tem de saber protestar. Por exemplo, é preciso saber fazer contas de sumir. Nunca se deve andar a tentar manipular o governo com exigências baratas, pois é sabido que os governos não se contentam com pouco, quando se trata de receber, nem se ralam com muito, quando é o protestante que paga.

Essa coisa de dizerem que protestam para que o governo os oiça é uma treta, pois sabem muito bem, que não há maior surdo que aquele que não quer ouvir. É exactamente a mesma coisa que acontece quando os protestantes também não querem ouvir as teimosias do governo.  

Bem sabemos que neste país é tudo lento, a começar pelos cem de Praga, que já andam na estrada há que tempos e não sabem ainda quando chegam a casa, apesar de estar entre eles o nosso presidente e a nata empresarial, tudo gente que, normalmente, não é capaz de estar quieta.  

O governo é lento que se farta, pois não há meio de convencer os aceleras de pé e de língua de que também têm de ser mais lentos, para não estarem a destoar desta calmaria onde dizem que nada se faz, nem nada deixam fazer.

Porém, de todos os mais lentos, são todos aqueles que se ultrapassam a si próprios, principalmente, quando metem a marcha atrás, não reparando que estão cada vez mais longe da linha da meta. Depois, dizem que vão em marcha lenta.

 

16 Abr, 2010

Vulcão cinzento

O vulcão islandês parou uma boa parte da Europa com o vomitar incessante e violento de labaredas que se transformam em cinzas, as quais obrigaram a encerrar muitos aeroportos, como está estampado em toda a comunicação social. Grande transtorno para muita gente que se viu retida inesperadamente, suportando prejuízos de toda a ordem.

Até aqui nada de novo, pois já toda a gente sabia isso e eu gosto pouco de andar a copiar o que vejo, leio ou oiço por aí, até porque há muita gente mais habilidosa que eu a fazer informação. Pois, além disso nem sequer tenho a respectiva carteira e longe de mim andar a fazer concorrência desleal a alguém.    

Mas, o que eu quero é dizer que todas as calamidades podem transformar-se em oportunidades. Daí que me tenha lembrado de que era chegada a altura de dar essa oportunidade ao homem que disse que a nossa presidência da república gasta cinco vezes mais que a casa real espanhola.

Trata-se de D. Duarte, o homem que ainda mantém princípios de realeza neste país republicano. Ora, acontece que o nosso presidente está retido em Praga por causa das cinzas do vulcão e, provavelmente, até pode demorar-se por lá, deixando o país sem a sua super visão estratégica e protectora.

Além do acréscimo de despesa que não entrou nas contas do régio contabilista, falta ao país o seu comandante natural e isso não pode acontecer. Vai daí que a oportunidade é excelente para deixar que o candidato a rei assuma, neste intervalo cinzento, as rédeas do poder presidencial, para demonstrar que gasta menos cá, no país, que o presidente gasta lá, em Praga.

Trata-se de uma oportunidade única, talvez a derradeira oportunidade, para nos convencer de que o rei, sim, pode meter o país na ordem. Mas, também uma boa oportunidade para nos convencer de que ele, D. Duarte, é capaz de gastar o mesmo, ou menos ainda, que a corte real espanhola.

Se tal não acontecer, país na ordem e poupança real, bem pode o nosso sucessor ao trono deixar de matar a cabeça a fazer contas desnecessárias, porque todos os portugueses sabem perfeitamente que já temos cá muito bons gestores republicanos, que não têm, nem nunca tiveram, qualquer problema em gastar até o que não temos, quanto mais o pouco que se consegue arranjar.

Chamo desde já a atenção para o facto de não estar a sugerir um golpe de estado ou uma mudança de regime, mas apenas a fazer uma experiência inofensiva de custos e benefícios que nunca chegariam a ser sentidos por ninguém, aliás como sempre tem acontecido com tantas experiências em que o país tem sido fértil ao longo dos tempos.

Paralelamente, e aí está outra oportunidade surgida, este período serviria também para se ver a diferença entre uma cooperação estratégica republicana e uma cooperação estratégica real. Haverá já quem diga que isso é tudo a mesma coisa. Isso não é bem assim, visto que D. Duarte está muito bem informado sobre a história de Portugal e, certamente, não deixaria de lembrar o rei D. José e o seu Marquês de Pombal.

Até o nosso presidente, em Praga, não deixaria de estar permanentemente atento ao desenrolar destas cenas, ou não fosse ele um estudioso de todos os fenómenos que se vão passando por cá, quer ele esteja presente ou ausente do país.

A propósito de fenómenos, que temos às dúzias, senão aos quarteirões, aposto que já haverá alguns, muito poucos, felizmente, a dizer que estar cá ou em Praga, não faz grande diferença, tal como seria a mesma coisa se fosse D. Duarte a estar retido em Praga.

Lá está, eu que sou mais economicista, diria que não senhor, não era a mesma coisa. De certezinha que D. Duarte não teria lá tanta gente com ele. Com o inconveniente de que se sentiria com mais dificuldade em passar o tempo.

Estes vulcões pregam cada partida às pessoas…

 

Apetecia-me dizer que são dois ‘cidadões’ portugueses com muita categoria, mas é melhor fantasiar um pouco como é hábito fazer-se em relação a cidadãos com muita notoriedade na nossa vida pública, política e futebolística. Se houver alguém que, por acaso, não se lembre deles, ou de ouvir falar neles, é melhor rever muito bem, com o devido cuidado, toda a sua vida na sociedade portuguesa.

Começo por revelar as únicas diferenças que consegui identificar entre eles. Sócrates Pinto é do Benfica, enquanto Nuno da Costa é do Porto. Aquele, não recebe absolutamente nada do clube, enquanto este, recebe muitos milhares por ano para ser o mais dedicado dos presidentes dos clubes de todas as ligas nacionais.

Agora vamos a tudo aquilo em que são muito semelhantes, talvez mesmo iguaizinhos, senão mesmo almas gémeas de um ideal de vida e de um desportivismo sem par. O mesmo se passa na política, em que ambos têm uma participação muito activa e interessada, sendo também ambos acérrimos defensores do lema, façam o que eu digo, mas não façam nada do que eu faço.

Ambos adoram ser primeiros, sendo Sócrates Pinto o primeiro de Portugal, enquanto Nuno da Costa ainda é primeiro nos pentas e nos tetras da primeira liga. Haverá quem pense que estes dados não são comparáveis, mas eu afirmo que o são, pela simples razão de que Lisboa e Porto, que cada um deles representa, também são duas cidades gémeas, iguaizinhas em tudo, cada uma com o seu rio a beijar-lhes os calcanhares.

São mesmo dois ‘cidadões’ exemplares nas suas actividades, ambos em tarefas governativas, qual delas a mais complexa, com a grande coincidência de que em ambos os casos as governações apresentam resultados altamente positivos, em que o país e o clube, salvo melhor opinião dos habituais super contra, se devem orgulhar dos excelentes resultados que não deixam margem para dúvidas sobre a eficácia dos dois gurus da alta finança.

Homens sérios e da mais alta reputação nacional e internacional, comprovada a toda a hora pelas entidades judiciais que, preventivamente, e para que as suas honras não sejam minimamente manchadas por qualquer suspeita, estão constantemente sob observação, embora isso custe os olhos da cara ao estado.

A grande maioria dos cidadãos portugueses entende que há aqui um contra censo, exactamente porque tem a correcta sensação de que, sendo duas personalidades intocáveis, é um desperdício económico-financeiro andarem a gastar balúrdios nessa observação permanente dos seus actos.   

Pergunta-se mesmo porque razão todos os inspectores que trabalham incessantemente dia e noite, para lhes seguirem os passos, durante anos a fio, com a certeza de que não lhes encontram o menor desvio, não seriam, esses inspectores, muito mais rentáveis, por exemplo, na caça aos desmemoriados das suas obrigações para com o estado.

Todos sabemos que o primeiro Sócrates Pinto e o primeiro Nuno da Costa têm apenas, em partes iguais, uns pecadilhos de gente séria, como foi o caso da Carolina de Nuno da Costa e da Manuela de Sócrates Pinto. Dois casos de amores mal sucedidos que apenas servem para ilustrar a semelhança entre estes dois primeiros, um da vida do país, o outro do clube do norte, ou seja, do Porto e arredores.

Até já me constou que, em tempos que já lá vão, enquanto a Carolina dançava, o dragão dava ao rabo, em sinal de a querer imitar, embora com muito pouco jeito. Tal qual se dizia que o benfiquista rabeava por todos os lados quando, às sextas-feiras, que nem eram dias de jogos, a Manuela manejava a língua e abria a boca em demasia, relativamente ao rodar dos olhos dentro dos limites das desmesuradas pestanas.

Como cidadão pacífico que sou, e conhecedor de que essas pequenas malfeitorias de ambos os primeiros, ainda não estão de todo sanadas, daqui faço um apelo muito sincero e generoso, para que o primeiro Sócrates Pinto deixe, definitivamente, a Manuela em paz. Que mais não seja, por solidariedade para com outro grande benfiquista que é o José Eduardo. Bom rapaz.

Do mesmo modo apelo à boa recordação dos tempos felizes de Nuno da Costa e Carolina, para que deixem de andar a caminho dos tribunais e lavem a roupa suja na máquina lá de casa. Hoje, já há detergentes que limpam tudo. E depois, era evidente que o clube não gastaria tanto dinheiro em advogados e juízes, enquanto a Carolina, não precisaria de dançar tanto para arranjar dinheiro para tantos processos.

Feliz o povo que tem pessoas em que se revê com orgulho, mesmo sabendo que ninguém é perfeito. Mas, o país está bem entregue, tal como o clube não podia estar em melhores mãos. E isto é que é fundamental. Será verdade que os trafulhas vêem trafulhice em tudo? ‘Sei, não! ...’

Conclusão: Não percam tempo com eles, porque dali não levam nada.

 

14 Abr, 2010

Chovendo no molhado

Mas que ano este, dizem todos aqueles que estão fartos de tanta chuva que caiu e continua a cair por todo o lado deste cantinho meio cercado pelas ondas do mar que, volta não volta, lá vão invadindo uma boa parte da outra metade. É por isso que andamos todos húmidos e, de vez em quando, até dá para muitos se divertirem a chapinhar na lama, que é a parente porca da chuva.

Como diria o meu compadre alentejano, continua chovendo no molhado e não há meio de se poder ver o campo semeado. Em boa verdade é o país todo que anda encharcado e nem por isso os profetas da casa deixam de regar a toda a hora, como se um gozo extra terrestre lhes regalasse o espírito por verem tudo a meter água, da forma mais natural que se possa imaginar.

Por esses campos fora, por entre os muitos que se encontram abandonados, já se vão vendo sinais de sistemas modernos de rega, como a mangueira ou a gota a gota, a aspersão ou os intermináveis canais, que são autênticas redes de meter água nas terras ressequidas do interior e também um meio de exaurir cada vez mais as nascentes naturais através dos furos que, cada vez mais, sugam a água de profundidades maiores.

Paralelamente, à superfície, a rega linguística é uma realidade que tem crescido muito com o tempo, como se a secura gutural, a garganta seca, levasse a uma necessidade de limpeza dos canais através da libertação anormal da voz, ou de outros meios de rega, casos da escrita, da imagem e do som, usados pelos mais sofisticados regadores, uns profissionais, outros amadores em actividade exclusiva.

E quando as torneiras se abrem, cuidado, pois todos sabemos como sai asneira da grossa e então, lá ficamos encharcados no meio de tanto chover no molhado ou debaixo dos regadores de crivo grosso, ou ainda, à mercê de jactos de línguas húmidas, nem que se apresentem sob a forma aparentemente suave de simuladores de nevoeiro.

Confesso que já tenho muita dificuldade em distrair o olhar ou sossegar os ouvidos, pois essa frase chata e espalhada por toda a parte repete-me teimosamente que não deixa de chover no molhado, quer tente olhar para a rua, onde só vejo guarda-chuvas abertos, quer tente ver umas imagens de televisão, onde o nevoeiro é permanente.

Quem diz televisão, diz rádios e jornais onde, salvo raríssimas excepções, todos os assuntos vão dar àquela chatice repetitiva de todos os dias e de todas as horas que é, autenticamente, chover no molhado. Chego a perguntar a mim mesmo porque razão, eles e elas, não enchem de vez a insaciável barriga, tal como eu já estou farto até às orelhas.

Chover no molhado é assim uma espécie de tortura provocada por aqueles e aquelas que falam, falam, falam, mas não dizem nada. Sim, porque todos os dias e a todas as horas eles e elas não acrescentam nada de novo àquilo que estão fartos e fartas de repetir. Se eles e elas gostam assim tanto de se ouvir, armados e armadas em papagaios e papagaias, que vão gozar os seus prazeres para um local íntimo, para que seja exclusivamente deles ou delas. 

Seria um acto de extrema simpatia se se lembrassem de mim, deixando-me a milhas de distância dos seus prazeres, para que eu também pudesse ter os meus momentos de gozo, bastando lembrarem-se de que eu já não os posso ver nem ouvir. Por isso lhes faço um apelo, por favor, poupem-me, que eu já sei de cor e salteado o vosso papaguear.

Chover no molhado é também fazer este e outros apelos que venham, seja lá de onde for, pois para eles e para elas é muito mais importante o bafio que emana das águas turvas que se acumulam à superfície, porque a terra já não come nem engole tanta porcaria que não param de lhe lançar em cima.

Enfim, esperar que alguém lá de cima olhe cá para baixo e tenha dó de mim, é coisa que não cabe cá nas minhas cogitações, o que me leva a seguir o lema, se não os podes calar, levanta a voz como eles. Assim sendo, também continuo a regar, contribuindo para que continue eternamente, chovendo no molhado.  

 

12 Abr, 2010

Víboras dominadas

Acho que tudo começou muito bem lá para os lados de Carcavelos, já que ficamos a saber que não precisamos do estado para nada, logo, vamos ficar muito melhor daqui a uns dias, porque ficamos sem aquilo que o estado nos tinham anunciado há dias atrás, com o dito, maldito e famigerado PEC.

Ficarmos sem correios ainda vá lá, se de Carcavelos tiver ficado a garantia de que não nos levam os telemóveis. Sinceramente, acredito que não, a menos que considerem que eles são um perigoso instrumento de utilização na corrupção dentro do estado. Mas, se eles acabarem com o estado, os telemóveis ficam.

Aliás, essa coisa das cartas em papel já não se usa, porque o país ainda tem muita gente que não sabe ler, mas já toda a gente tem um ou mais telelés para se entreter a olhar para eles e treinar a fazer tique toque no teclado, mesmo sem falar com ninguém. Isto sai muito mais barato que gastar tinta ou esferográfica, papel e selos de correio, ainda que a saliva substitua a cola do sobrescrito.

Depois também se precisava dos correios para depositar uns euros, mas isso foi chão que deu uvas e hoje, ou não se deposita nada, porque não há pilim, ou se depositam balúrdios, mas isso não é nos correios, porque esses ainda não sabem para onde é que vale a pena mandar o cacau.

Quanto à Caixa, pois, aquela de quem dizem que caixa é banco, eu compreendo que haja quem esteja mordidinho de pressa em substituir a mina que foi o banco dos negócios. Sim, esse do milhão por uma assinatura, à noite. Pois, esse onde os amigos da mesma cor tinham uma taxa garantida por um tal de Oliveira. Agora que já deu o que tinha a dar, reclamam uma Caixa forte, recheada de notas grandes, quem sabe para vir lá um loureiro qualquer na senda dos milhões à mão de semear. Perdão, à mão de colher.

Lá que me levem a Telecão e todos os que ladram por dentro e por fora dela, isso não me impressiona minimamente, porque com telecomes ou com telebebes, eu quero é que não me tirem o telemóvel, mesmo escutado, pois quem me tira a conversa tira-me tudo, mesmo aquilo que eu nunca tive. Confesso que sempre falei pouco mas, em compensação, oiço tudo, mas mesmo tudo, ainda que seja qualquer tipo de asneiras.

Estas e outras coisas eram antes de Carcavelos. Agora, depois que dali saiu o grito de que o estado só complica e as coutadas é que facilitam, fiquei aliviado, porque esperava coisas muito piores. Sim, o fora com o estado da saúde, não me admira nada, pois eu já desconfiava que eles sabiam que eu não estava doente.

 Aliás, se estiver doente, fiquei a saber que me posso tratar em qualquer lado, de preferência em casa e, principalmente, se o seguro não quiser ou não puder tratar um teso como eu. Como o estado também vai sair das empresas, por exemplo, dos seguros, só podem entrar os que andam por aí a salvar bancos, guardando a massinha deles em casa. Só ainda não percebi porque é que o estado andou a encher os cofres que os outros esvaziaram.

Em contrapartida, estou radiante porque já vou poder mandar os meus descendentes estudantes para Oxford ou para a Brutolândia, sem pagar um cêntimo. Ainda não estou esclarecido sobre o que vão eles aprender por lá, mas não faz mal. Em Carcavelos ficou bem claro que não vai haver problema em convencer-me, a mim, e a todos os reguilas do Carcavelinhos, de que vai ser assim, e mai nada.

Agora, novidade e novidade de arromba é que, finalmente, já ouvimos de viva voz, aquilo que os profetas de Carcavelos andavam há muito tempo a congeminar. Vamos ter o privilégio de poder ajudar a salvar a continuação da boa vida dos homens e das mulheres que, em Carcavelos, conseguiram dizer que estão unidos na repartição entre eles, dos impostos que pagamos.   

Mas, com a super novidade de que, para melhor os ajudarmos, vamos ter os nossos salariosinhos e as nossas reformazitas ligeiramente diminuídos, coisa que não tem nada a ver com a malandrice de não ter havido aumentos no princípio do ano. Estou inteiramente de acordo que se reconheça o carácter justo e oportuno destas medidas, dado o consenso que tem existido entre todos os reguilas do Carcavelinhos.

É claro que se adivinha uma acalmia tranquilizante, um aumento inusitado da auto estima e da confiança de todos os felizes contribuintes perante tão justas medidas. E uma tranquilidade total de todos os empresários, que vão deixar de ser empresários públicos, onde nem podiam receber uma caixinha de bombons pelo Natal. Era uma crueldade sem nome.

Todos sabemos que o país tem sido, antes de Carcavelos, um deserto cheio de víboras à solta. Mas, isso já era. Agora, em Carcavelos, surgiu um herói que conseguiu cometer a proeza de meter todas as víboras dentro de um único saco. Sem uma única mordedura. Pois é. Temos de concordar que é obra.

Mas, porque é que ninguém se lembrou de fazer isto há mais tempo?                

 

 

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