Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

afonsonunes

afonsonunes

Pois, foi tudo tão rápido que ninguém teve tempo de se refugiar nos abrigos. Nem tivemos dois segundos para prestar atenção, pois a explosão foi imediata, a seguir à chamada da dita. A surpresa só não foi total porque há sempre quem leve muito a sério os sinais que nos chegam dos astros, enquanto outros lhes voltam as costas.

Obviamente que o pedido de atenção não serviu para nada, mas o estrondo, o pum, acordou o pessoal que tem andado a dormir. E também o pessoal que, estando acordado, confiava cegamente que não havia pólvora suficiente para lhes queimar as pestanas, uma vez que, primeiro, estavam todos aqueles que têm ocupado a primeira fila.

Esqueceram-se de que estavam, mas já não estão, havendo agora que aguentar com o que der e vier, pois o tempo de assobiar para o lado já lá vai. E, estou plenamente convencido de que isto foi apenas uma pequena explosão de aviso, do tipo de, não se assustem, que a seguir, vai ser bem pior.

Convém mesmo estarem preparados para uma situação de rebentamento pelas costuras de uma qualquer bomba de que resultará uma situação rebentada. Tudo indica que depois desta situação se concretizar, como parece inevitável segundo os horóscopos mais credíveis, não adiantamos nada em ter esperança na segunda parte da profecia.

Diz esta que, depois do rebentamento, ainda vamos a tempo de ignorar o que explodiu e apanharmos todos os cacos para, com eles, todos coladinhos com saliva, construirmos um país novo, assente na teoria de que, do velho se faz novo, desde que a pintura final tenha a cor que mais nos agrada.  

A situação era de pré-explosão mas já não é. Pela simples razão de que, entretanto, já atingimos a situação de explosão, com barulho e tudo, mas que irá aumentar à medida que se for verificando que os cacos, na maior parte dos casos, ficaram muito estilhaçados, mal valendo a pena gastar cuspo com eles.

Depois de bem avaliada esta explosão há, para mim, uma situação que nada tem a ver com destruição. Antes pelo contrário. Havia uma bíblia com trinta e quatro páginas onde estava tudo tim-tim, por tim-tim, minuciosamente explicadinho até dois mil e catorze. Por obra e graça da sabedoria, essa bíblia foi desmultiplicada.

A situação pós-explosiva transformou essa bíblia em papelinhos que fizeram um almanaque de cento e vinte e nove páginas, o que demonstra à evidência que o poder do falatório consegue transformar o que é claro e conciso, numa baralhação de palavras que mais parecem um rastilho que indicia nunca mais chegar à bomba.

Assim, depois de ter-mos uma situação de pré-explosão, corremos o risco de entrarmos na situação permanente de pós-explicação do que se quer fazer, a qual permite sempre a alguém ir pisando o rastilho, de forma que se caia na velha situação de se pensar depressa demais e esquecer ainda mais depressa.

Estamos numa fase de expectativa. Estamos em cima de uma carga explosiva. Estamos à beira de uma onda corrosiva. Estamos cercados por arautos da mensagem abusiva. Estamos amarrados por meio de fita adesiva. Estamos em cima da hora para a conversa decisiva. Estamos em risco de uma situação implosiva. Mas não estamos com ideia subversiva.    

Certeza, certeza, é que, com o Pum explosivo, já nos arrombaram os cofres pessoais, aproveitando o facto de a maré estar de feição.

 

 

29 Jun, 2011

Ninguém gosta dela

Quando se diz nada, nunca ou ninguém, há sempre um risco muito grande de se estar a botar sentença em coisa que se não domina. Tal como dizer que desta água não beberei. Há palavras e expressões que, por muito que nos pareçam fontes de sensatez, podem traduzir, efectivamente, um manancial de mentiras.

Isto, a propósito de ter posto lá em cima que ninguém gosta dela. Genericamente falando, é verdade, mas a realidade é bem diferente. Há sempre alguém que gosta do que eu não gosto. Há sempre um sem número de interesseiros que se demarcam de quem não entra, nem quer entrar, nos seus interesses.

Por mais detestável que ela seja, haverá sempre alguém que veja nela o reflexo de uma beleza qualquer que, manifestamente, incomoda quem é vítima do seu olhar permanente e cortante, do remexer constante das suas mãos sujas e arrebanhadoras, do seu mau carácter que subjuga com a sua voz de engano e traição.

Ninguém diz abertamente que a deseja, mas alguns não a conseguem tirar do pensamento, uma ideia fixa que lhes faz esquecer os outros, que são todos aqueles que a detestam e lhe sofrem os danos, como se os males destes, servissem àqueles de bálsamo para as suas feridas íntimas provocadas pelo orgulho e pela sofreguidão.

Ninguém gosta dela, mesmo sabendo que se trata de uma velha e rabugenta personagem que nasceu de geração espontânea, que cresceu por entre a miséria de quem nunca foi capaz de a olhar de frente e fuzilá-la com esse olhar, numa execução sumária, independentemente da douta sentença que viesse a seguir.

Sentença que seria inequivocamente pronunciada por quem sempre a viu crescer com a maior das indiferenças, quantas vezes com o maior dos sorrisos de íntima satisfação, ao estar a contribuir para a garantia de que ela nunca lhe baterá à porta, nem sequer para lhe mostrar a sua repulsa pela discriminação que provoca em quem é, e sempre foi, vítima indefesa.

Ela, de quem parece que ninguém gosta, acaba por ter os seus momentos de prazer, mesmo de glória, quando alguns a recomendam como sendo a salvação de todas as vítimas do seu devastador poderio, da sua ganância esmagadora de todos mínimos de sobrevivência digna num mundo onde, à partida, algozes e vítimas, todos, deviam nascer, crescer e morrer iguais.

Agora, ela aí está, pujante, avassaladora, entronizada, imposta pelos que não deviam contar quando falamos em ninguém, mas que são alguém, ainda por cima alguém que se sobrepõe a quem constitui a grande maioria que chegava e sobrava para, em qualquer espécie de democracia, assumir o poder que, naturalmente, lhe devia pertencer.

Ela, mais que detestada pelo povo, super desejada pelos inimigos do povo, caiu em cima dele, qual nuvem asfixiante desse povo que não usa máscara protectora contra nada, nem contra ninguém. Porém, por mais espessa que ela seja, não passam despercebidos vultos de mascarados, contra quem ela não pode interferir.

Como não há regra sem excepção há, dentro do povo, uns inimigos dela que tudo fizeram para que ela se transformasse no monstro que é hoje. Tudo lhe pediram, tudo lhe exigiram, tudo esbanjaram, obrigando-a a tornar-se incontrolável. Hoje, esses amigos que a geraram com os seus desmandos são dos que mais barafustam contra ela.    

Ninguém gosta dela. Essa malvada tem nome e anda nas bocas do mundo mas, naturalmente, os portugueses conhecem-na, e de que maneira, sentindo um bafo gelado sobre as suas cabeças vergadas ao peso das suas exigências. Nem me atreveria a pronunciar-lhe o nome porque ele queima os lábios. Mas escrevo-o a contra gosto. Ela, a odiosa, é a Sra. D. Austeridade.      

 

 

25 Jun, 2011

Os novos optimistas

Acabou de se estrear em exames preliminares e disse que não podiam ter corrido melhor para Portugal. Atendendo a que esses exames vêm exactamente algumas horas depois de ter sido confirmado o examinando, só há uma conclusão a tirar. Portugal estava bem preparado para se submeter a exame.

Tanto mais que o examinando não se cansou de se considerar grego em devido e oportuno tempo, defendendo agora no exame a teoria de que ele, grego, nem pensar. Bem-aventurados os que dão a mão à palmatória sobretudo, depois de saberem que o professor já não tem régua para fustigar as suas mãozinhas.

Afinal, a um inveterado optimista sucede um optimista antecipado, pois ainda antes de saber ao certo o que vai fazer, já sabe que vai sair tudo bem. Mas, a avaliação do país actual, que não é ainda o dele, avaliação feita e aprovada com distinção, ao que nos diz o examinando, revela que o país vai no bom sentido. Dizem eles.

O que me parece pouco justificado, é o tom optimista de agora contra o tom catastrofista de tempos bem recentes. Afinal, gostaria de saber qual o estado real, deste estado falido e em bancarrota de há dias e o estado viável, muito longe de se ver grego, que não vai falhar. Há coisas que não consigo entender.

É o caso da subida vertiginosa dos juros. Quando tudo me levava a crer que estes novos portadores de confiança, estes amigos e aconselhados do FMI e seus parceiros, iam fazer baixar drasticamente o preço do dinheiro, eis que já quase duplicou desde que se soube que lhes competia a eles pagar os calotes do país.

É o caso da prova de confiança do mister adjunto Europa, português do mundo, português dos desafios perdidos, grande amigo do outro português agora reformado à pressa, que sucumbiu aos elogios dele e de quem manda nele. Chego a pensar que os actuais elogios ao sucessor, não auguram nada de bom para o destino que nos espera.

É o caso da bolsa de valores onde ‘o PSI20 vive o maior ciclo de quedas semanais em três anos.’ Isto é dinheiro e é confiança no futuro para os investidores. Isto quer dizer que o novo ciclo é uma maravilha. Tal como o MAI, onde ‘em tempo de guerra não se limpam armas’. Mas substituem-se espingardas por bastões, ou seja, governadores por secretários.

É o caso da evidente incapacidade de aceitar o saber perder, como aconteceu com a derrota na assembleia com a teimosia Nobre. A reacção não abona em nada o seu sentido de aceitar o que não propõe. A Madeira e os Açores levaram o troco através dos seus representantes. Por mim, tudo bem, porque eu gosto da Assunção. Mas não gosto de vinganças.

É o caso de nenhum partido ter aceitado colaboração com o PS em soluções governativas e agora quererem envolvê-lo na responsabilidade de fiscalizar a execução dos acordos com a troika. Como é sabido, a execução dessa tarefa compete à assembleia e só por pura hipocrisia ou por querer arranjar um bode expiatório, se lembram desse disparate.  

É o caso de já se ouvir falar de pressões sobre a justiça, os submarinos em questão, quando era de esperar que as pressões fossem coisas do passado. Tal como a demissão na forja do PGR. Tal como as preocupações de um dos parceiros, sobre a lista de boys do outro parceiro, que jurou por todos os santinhos que isso ia acabar. Não se sabe é quando.  

É uma maravilha. A reunião lá fora correu muito bem. Porém, cá dentro, parece que as coisas por enquanto ainda estão a correr melhor. Tal como lá fora, cá dentro ainda não se fez nada, justificadamente, diga-se, mas então que comecem a falar quando começarem a fazer qualquer coisita que a gente veja.

É por isso que eu, sempre muito incrédulo no que diz e vaticina a maioria dos nossos comentadores e críticos, desta vez até concordo com alguns, que dizem que é preciso abrir os melões para saber se eles são bons ou não prestam. E, por enquanto, ainda não vi sequer os melões, quanto mais algum que já estivesse aberto.

Neste início de ciclo já me foi possível tirar uma conclusão que me parece óbvia. S. Bento é um lugar onde nasce optimismo, tal como jorra água das fontes no inverno. A comparação não é despropositada, uma vez que os inquilinos de S. Bento já nos provaram que todos têm sido exímios a meter água, uns por culpa própria, outros porque lhes põem um funil na boca.  

Portanto, é preciso muito cuidadinho, pois com água até cá acima, há sempre o perigo de alguém se engasgar.

 

 

24 Jun, 2011

Os dez mandamentos

O facebook é desde há muito a bíblia dos portugueses que aderiram às novas tecnologias da informação. Até porque os portugueses adoram seguir os exemplos que vêm de cima, nomeadamente através de recados, recomendações, princípios, etc.

Ora, interpretando correctamente a situação, o nosso bigboss aproveita essa facilidade e, sempre que o entende, lá aproveita a página bigbossal para os seus desabafos, normalmente, boas lições de técnicas governativas.

Como é sabido, o nosso bigboss, antes de presidir, governou. No intervalo, que foi um pouco prolongado, esqueceu o que fez, reflectiu profundamente no que devia ter feito e chegou à conclusão de que devia tentar de novo.

Como nem sempre o deixaram trabalhar enquanto governou, entendeu por bem ir lá para cima, onde pudesse ser ele a deixar, ou não deixar, o outro trabalhar. Durante uns tempos deixou. Depois arrependeu-se e, de repente, não deixou.

Tudo bem, até porque se fartou de mandar recados nem sempre com a esperada resposta. Em boa verdade, essa coisa dos recados não era uma boa maneira de governar. A difusão desses recados tinha muito ruído e ele preferia que o acento tónico recaísse na sabedoria.  

A coisa saiu conforme o esperado e aí está ele nas suas sete quintas, patrão e gerente de loja, em que os recados não têm hipótese de arranjar um lugar de sobrevivência. A menos que fossem trocados entre si e a sua sombra, coisa meramente teórica.

Foi então que se lembrou dos mandamentos, ideia que lhe surgiu dos Dez Mandamentos de que fala a religião que professa com toda convicção e prática diária. A ideia amadureceu muito rapidamente e daí a torná-la realidade foi um suspiro.

E assim nasceram os dez mandamentos da sua ‘magiscultura’, a bíblia para a nova loja, a que já chamam de geracional, apesar de ainda não ter gerado nada. Mas já tem bíblia para o capataz rezar, todos os dias do ano, sem feriados nem pontes, sem férias nem escapadinhas.

Dez mandamentos que são um programa completo para ninguém falhar, dez mandamentos da autoria de quem manda mais do que quem devia mandar, dez mandamentos para fazer esquecer os tempos em que o seu autor mandou.   

Até parece que o país sempre teve bons dirigentes ao nível da gestão, mas também parece que todos adormeceram antes de se irem embora. Todos menos este, que acordou agora. Tarde, mas acordou. Apesar de ter havido despertador.

Tem a garantia de que tudo vai correr bem. Garantiram-lhe que o negócio não falhará. E ele já acreditou que tudo o que lhe dizem agora, é a verdade pura e dura. A verdade é que até todos os portugueses, os maiores incluídos, já se enganaram, ou foram enganados, vezes sem conta.

Cautela e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. E deitar foguetes antes da festa nunca foi um bom prenúncio de folia garantida. Com recados ou com mandamentos.

 

 

23 Jun, 2011

A noite do martelo

 Apostava tudo o que tenho em como o mestre André não estará no Porto nesta noite da martelada. E não será por falta de assinatura de uma dispensa do patrão milionário Abram, que também não arriscaria um passeio pela noite de hoje na Ribeira.

Não sei se o ano passado, neste dia, o mestre André foi o mais assediado de todos os martelados da noite de S. João, até porque nem sequer sei se ele se meteu nessas andanças, devido à sua inexperiência nesse jogo de cabeça.

Mas, este ano, de certeza, teria memo a cabeça a prémio e, não sei não, se os martelos não seriam muito mais pesados que os habituais. A menos que fosse convidado e acompanhante do seu ex-patrão, Jorge Costa, que o defenderia com a sua mão protectora.

Um bom negócio para dois, sem dúvida, que bem mereceria um S. João como deve ser, não fossem os riscos dos exaltados bocas-de-fogo, que não querem saber senão dos negócios que valem pontos que, hoje em dia, é o que está a dar.  

Porém, já ouvi dizer que aquilo é como uma monarquia. Há sempre soluções de sucessão logo, nada impede que os martelinhos funcionem na perfeição, com o Vítor e seu patrão, para sossego dos assustados, a coçarem na cabeça de vez em quando.

Está tudo nos conformes, ou não fosse a noite do martelo na Invicta. Martelos que não param um segundo, manejados com aquela meiguice que é característica das gentes sorridentes e generosas da grande nação nortenha.

Já a outra nação, a que foi do mestre André, tem momentos que inspiram algum receio por parte de quem não é súbdito nem habitual nos seus festejos, por vezes ornados com umas marteladas que são mesmo a doer.

No resto do país, as marteladas são outras, segundo um vocabulário mais a atirar para o nacional e que têm a ver com os tradicionais bailaricos que servem de balões de ensaio para um final de noite, princípio de manhã, com muito amor e carinho.

Quando a sardinha assada e os seus diluentes já estiverem consumidos, depois do desgaste energético de uma noite em claro, mas que nem por isso será menos produtiva em termos de desgaste vigoroso nas manobras a dois, com o martelo a servir de broca imparável.

 É por isso que a noite que aí vem, a noite de S. João é, e sempre foi, a noite do martelo.

 

 

22 Jun, 2011

Abriu a caça

Neste inédito ano cinegético agora começado, nenhum caçador pode falhar um único tiro. Porque o chumbo está pela hora da morte e a pólvora nem se pode cheirar. Depois, já não há Sócrates para se disparar de olhos fechados, sem atender aos custos de tantos tiros sem o proveito de uma peça de caça para o jantar.

Acresce ainda que o país não pode suportar tantos tiros nos pés, por parte de caçadores míopes que atiram a tudo quanto mexe. Depois, lá vão eles a caminho do hospital, provocando aquela sensação de que mais lhes valia ir ao pé-coxinho, que esperar pelo socorro através dos meios mais baratos.

Esta nova época tem a particularidade de nela ter sido interdita a caça ao coelho. Porque, não estando nós na China, ouvimos determinar a quem de direito que este, e mais os três anos que se seguem, são os anos do coelho. Portanto, muito cuidado, porque ninguém pode acertar, senão lá se vai a arma e não sei que mais.

Vão ser complicados estes anos que se seguem porque, por um lado, não se pode falhar, e ele sabe que não falhará. Por outro lado, não se pode acertar no coelho, porque está protegido por uma voz do além. Não é fácil ser caçador nesta coutada onde as lebres e as perdizes vão ter a vida muito mais complicada, por causa das discriminações.

Sim, porque a caça grossa sempre teve imunidade dentro da coutada. Quando teve o azar de apanhar com algum chumbo de raspão, lá vai ela para o lado de fora, ou mesmo definitivamente para fora. Para onde os nossos caçadores não põem o pezinho, senão perdiam de imediato o emprego na coutada.

Estou completamente rendido à nova administração da coutada. Surpreendentemente, já convenceu todos os caçadores a cumprirem escrupulosamente os seus deveres. A começar pela obrigação de todos, mas mesmo todos, serem portadores da respectiva licença de caça. Obviamente, que isto não era tarefa nada fácil.

Mas, bastou aos novos administradores confessassem que, para darem o exemplo, já todos possuíam esse importante documento, o que não acontecia antes de terem tomado posse. Esta atitude caiu bem nos caçadores furtivos, alguns dos quais já se mostraram disponíveis para pagar a multa respectiva.

Porém, ainda há uns ínfimos pormenores a acertar, para lá dos aramados da coutada. Um pequeno mas aguerrido grupo de crianças exigem a pele do coelho já. Coisas de crianças que ainda nem sabem que o coelho não pode ser esfolado vivo, pois está bem claro que não se lhe pode atirar e, à mão, ninguém chega ao fundo da toca.

Dentro dos aramados, muitos dos que carregavam permanentemente a espingarda com o Sócrates na mira, andam agora mais leves, limitando-se a fazer a apologia do coelho, como animal de extrema utilidade em tempos de crise, agora em reprodução acelerada por causa das necessidades cinegéticas da coutada.

Não me surpreenderia mesmo nada se aqueles que mais espingardeavam até há pouco tempo fossem os primeiros a começar a espingardear por causa da imunidade dada ao coelho. Também não surpreenderá, se os socráticos começarem a acusar os que gostam de coelho de terem um tachinho ao lume na coutada.

E não podem levar-lhes isso a mal, pois são assim as voltas da caça que, para muitos aselhas no manejo do gatilho, são as contingências de muitas dessas voltas acabarem com um bode à cintura, bode que não pesa nada, nem serve para temperar a panela no fim do dia. É triste, mas ainda mais, quando não se pode sequer levar um caçapo para casa.

Pois é. Abriu a caça. E já houve chumbo desperdiçado. Isso quer dizer que juízo é coisa que não abunda. Mas abunda inovação na caça feminina. Duas Assunções já tramaram dois lobos famintos de poder. Com dois tiros certeiros. Boa pontaria.

 

 

 

Nas feiras, nos mercados ou à beira da estrada, comprar um, ou comprar uma dúzia, não é a mesma coisa. Seja lá qual for a mercadoria em questão. Do que se trata na realidade é do preço de quantidade. Que pode ainda vir a ser melhorado se o comprador for mais arguto que o vendedor, regateando habilidosamente.

Acabamos de assistir a um negócio em que estavam envolvidas doze unidades. Duas dessas unidades eram os negociadores e as restantes dez eram as unidades transaccionadas. A finalidade do negócio era a composição de uma equipa, em que os dois negociadores eram candidatos a capitães da dita.

A concretização do negócio, tal como fora previamente anunciado, até foi fácil e rápida, uma vez escolhida a liderança, que assentou no princípio de que manda mais quem parece que não manda nada. É assim uma espécie de haver um que pensa, o terceiro, e o outro que transmite às dez unidades o que devem fazer, que é o primeiro.

Temos assim uma equipa com doze, uma dúzia de unidades, relativamente baratinha pois, ao que dizem os entendidos, tem grandes qualidades técnicas e estratégicas, tem enormes conhecimentos sobre as equipas com quem vai competir, embora lhe faltem pontas de lança, os que marcam, logo, os que poderiam ser mais caros.

Dizem-me agora que o presidente do clube, os adjuntos e os suplentes vão colmatar essa deficiência. Aí tenho de colocar as minhas reticências. Então, tem lá alguma lógica que não seja o capitão da equipa a tomar as decisões e a transmiti-las a todas as unidades? Se assim não for, para que se teve tanto trabalho a eleger o capitão?

Até porque eu não acredito que os adjuntos e os suplentes sejam menos de umas dúzias que, mesmo com o tal desconto de quantidade, vão ter o seu preço. Ora, se o preço for superior ao das doze unidades, também é natural que o peso das suas decisões ponha em causa a eventual leveza das decisões do capitão. Mesmo com um presidente muitíssimo atento.

Assim, prova-se que nem sempre a sabedoria popular deixa de pôr em causa a justeza dos seus ditos. ‘À dúzia é mais barato’, eventualmente, pode tornar tudo mais caro sobretudo, se nas trocas se meterem muitas dúzias. Além disso, pode perder-se um capitão de equipa que, começando vencedor, pode acabar como o grande derrotado dessa equipa.

Acresce ainda que uma equipa com dois candidatos a capitão tem o inconveniente de ter duas vozes de comando. Nesse caso, conta menos a hierarquia que o tom de voz dos decisores. Conta mais a tarimba que a hesitação provocada pela obrigação de não poder falhar. Porque se algo falhar, nunca será a tarimba a pagar a factura.

Contudo, nunca se pode esquecer que no clube há a décima terceira unidade que, para os mais supersticiosos, pode dar azar. Sim, porque eles pensam que os presidentes por vezes só atrapalham. Por exemplo, quando tenham que meter o bedelho entre o capitão da equipa eleito e o candidato que mais pensa e mais alto fala.

A tarimba entre o primeiro e o terceiro, eis a questão. O segundo não conta porque tem de estar muito atento aos números, não podendo, até porque não está preparado para isso, meter-se nas habilidades de saber ou não saber tirar partido do seu jeitinho para exigências mais ou menos complicadas para a equipa.

Mas, o terceiro tem todo o jeito do mundo para tirar partido das suas qualidades negociais, com a vantagem da sua imprescindibilidade dentro da equipa. Quando assim é, a tarimba é que conta. É assim uma espécie de pegar ou largar de quem tem a faca e o queijo na mão. E o capitão da equipa tem de se acomodar, se quer ganhar jogos.

Disputou-se hoje o primeiro jogo a doer. Era apenas uma dor que não provocava incapacidade. Mas era uma dor moral. E o capitão da equipa teve a primeira derrota, no primeiro jogo da época. Precisamente, porque não ouviu o terceiro, arrecadando este a primeira vitória, que serve apenas como um aviso.

Um aviso sério. Quando dois precisam um do outro, não pode haver teimosos. O presidente do clube tem de estar atento e evitar braços de ferro. Estas vitórias não se compram à dúzia. Nem as derrotas podem ser simples borlas. O barato, por vezes sai caro.   

 

 

19 Jun, 2011

Vai correr tudo bem

Nem podia ser de outra maneira, pois todos sabemos que depois da tempestade vem a bonança. Tanto mais que depois de um início sobre rodas, em que tudo correu às mil maravilhas, aliás conforme estava planeado e sem grãos de areia na engrenagem, a máquina está perfeitamente oleada e pronta a dar o máximo.

E o máximo é, como já se nota perfeitamente, os entendidos falarem agora de confiança no futuro, quando ainda há dias falavam da inevitável bancarrota. Como exemplo, lembro os ilustres Medina Carreira e Eduardo Catroga, os especialistas mais citados na televisão pública, neste dealbar do novo ciclo, em que a catástrofe começa a diluir-se.

Só me faz alguma confusão o facto de os doze salvadores ainda não terem ocupado os seus exigentes postos de laboração e já terem conseguido fazer metade do seu trabalho futuro que é, precisamente, ganhar a confiança dos tão sabedores, conhecedores e autores das mais aterradoras previsões.

Que Deus e os decisores da UE e do FMI os ouçam e lhes dêem o crédito de que estão agora rodeados cá dentro, tal como o tiveram há bem pouco tempo, ao afirmarem que o país não tinha salvação possível. Talvez digam que não mudaram de opinião, que não mentiram, que sempre pensaram e cantaram, ié, ié, agora é que é.

Sócrates vai-se e Coelho vem. Se, como tudo indica, esta era a chave do problema, então ele está resolvido. As medidas já estavam tiradas a um e ao outro. Bem ou mal tiradas é o que o tempo nos irá dizer, para lá das previsões dos entendidos que já falharam vezes sem conta, ao tomarem ou aconselharem medidas muito mal tiradas.

As fatiotas têm saído sempre com defeitos de adaptação aos respectivos físicos, variando desde a calça curta de canelas e meias à vista, até às cinturas largas onde se nota claramente a falta de barriga para as encher. Mas, de barrigas cheias não temos tido falta, e cada vez haverá mais, enquanto as barrigas vazias não vão também parar de aumentar.

Estranhas, estas contas, de muito difícil leitura. Tão difícil que provoca estranhos lamentos e dúvidas em quem mudou de fatiota, sabendo a barriga que tem, ou não tem. Até parece que houve claramente também, quem tivesse mais olhos que barriga, ao escolher as calças em que se meteu, sem atender ao número que gasta.

Ao contrário do que parece, isto não é um problema de pronto a vestir. É um problema de alfaiates que não sabem, ou não querem, tirar boas medidas a clientes que estão sempre à espera de melhorar o visual com as modas que outros lhes impingem. Depois, ao vestirem as novas fatiotas é que notam os defeitos que elas apresentam.

E ainda a chuva não apareceu a fazer das suas. Depois do fatinho molhado, a coisa vai notar-se mais. Porque a chuva nunca alarga nada, a não ser o seu leito de enxurrada. Mas, encolhe sempre o fatinho de quem se arrisca a andar à chuva sem o respectivo guarda. Guardem-se pois os incautos que escolheram roupa justa.

À cautela, convém que vão dando uma olhadela à volta certificando-se de que, por perto, há um porto de abrigo baratinho onde possa acolher-se em caso de emergência. Como está tudo pela hora da morte, uma gripe ou uma constipação mais renitente vai dar em pneumonia. Depois, vai precisar muito do carinho e da solidariedade de quem sabe disso.

É evidente que nunca lhe faltarão as aspirinas, o copo de água para as tomar e mãos amigas que lhe limparão o suor provocado pela febre. Encontrará muito amor à sua volta que, com todas as vantagens do mundo, substituirá os medicamentos caros e abundantes em demasia nos hospitais do serviço público.

Logo hoje é que me havia de dar para isto. Lá fora até está sol, não faz frio, e ainda ouço lá ao longe as sirenes do INEM a caminho do hospital, com gente aflita lá dentro. Mas, já ouço dizer que ali há muito despesismo, falta de carinho e de solidariedade, que poderiam ser obtidos a custo muito menor a meio caminho do hospital.

Mas, hoje é domingo. A partir de amanhã, melhor, de depois de amanhã, terça-feira, após o meio-dia, nada disto fará sentido. Não tenho dúvida alguma. Vai correr tudo bem.

 

 

15 Jun, 2011

Vida nova

 Adoro sentir que alguma coisa de novo anda no ar. É o que pressinto agora com o meu país a experimentar aquela sensação de que, daqui em diante, toda a gente se vai entender às mil maravilhas, sob a batuta de um governo que quer, pode e manda.

Quando vejo e sinto toda a gente sintonizada na mesma onda, não posso deixar de estar nessa, de alma e coração, à espera, ansiosamente, para ver como vai ser possível essa transformação radical da velha vida do prazer total, em vida nova nacional.

Confesso que vai ser muito bonito verificar que vamos passar de uma situação de todos os partidos contra um, para uma situação de um por todos e todos por um. No caso será mais ou menos uma situação de dois por todos e todos por dois.

Trata-se de uma mudança inédita no nosso país. Com a segurança e a garantia de que haverá um que não deixará que ninguém toque nos dois, ainda que ele tenha de tocar a sério nos outros todos, doa a quem doer, que isto não está para folclore.

Para mim, isto é excitante, é mesmo vida nova, até porque não há margem para duvidar da eficácia da força colectiva agora desencadeada, não se sabe como, em troca da velha vida de contendas permanentes, que já passaram à história.

Tenho a certeza de que o mundo já mudou um bocadinho nestes dias da nossa unanimidade, mas o mundo vai mudar totalmente à medida que o nosso exemplo vá sendo seguido lá fora, tal como aconteceu outrora com a nossa revolução dos cravos.

É evidente que desta vez não foi preciso revolução nenhuma, daí que os cravos também não ficariam bem, apenas cravados em algumas lapelas, mas também porque não havia G3 para os colocar nos canos, além de que os militares, alguns de saias, também já são outros.

Parece que os nossos revolucionários se transformaram em monetários, só assim se compreendendo esta união de fundo, já internacional, que nos vai trazer um grande capital de esperança, cada vez com juros mais baixos, como tem vindo a acontecer.

Suponho que já ninguém poderá duvidar de que estamos mesmo no limiar de uma vida nova, ainda que porventura com alguma gente velha, mas absolutamente reconvertida e inserida na lógica da eterna juventude dos que vão sucedendo a si próprios.

Que ninguém pense na vida velha e, sobretudo, que nenhum baixo pense em bota. Aí, logo soariam as campainhas de alarme do alto da torre, que domina tudo o que tem por baixo, agora com a sua posição frontal de intolerável opositor de tudo o que for bota abaixo. 

O país não suportaria nesta vida nova, o que teve de suportar na vida velha. O país não perdoaria aos malvados da vida velha, se fossem agora os sósias dos velhos que já estão a ditar as regras da vida nova. Lá diz o povo na sua sabedoria: não faças aos outros o que não gostarias que te fizessem a ti. A vingança nunca deve ser servida: nem quente nem fria.

Adoro estas voltas e reviravoltas que me levam a confundir velho com novo e vice-versa, como se o usado pudesse ser qualquer um deles, sem que a minha apreciação demonstrasse qualquer atitude de menor valorização. Vamos para um novo ciclo, dizem. Só espero que não seja o velho círculo vicioso.

Até me apetecia dizer que é tudo igual ao litro, mas não digo. Foi um pensamento leviano e inconveniente que muito lamento. O país precisa de todos os que fizeram asneiras, há muito ou há pouco tempo. O mundo e o país sem asneiras seriam como um curral sem asnos.

O país precisa de quem continue a fazer asneiras, mesmo que tenha de falhar, como tantas outras vezes em que já houve falhanços. E clamorosos. Dizer que não podemos falhar é a mesma coisa que dizer que quem está de fora racha lenha. Porque a lenha tem de ser rachada senão nunca mais ninguém se aquece.

Haja pois vida nova. Não vida nova na continuidade da velha. Com as ideias velhas em cima das novas. Mas, cada qual com as suas ideias. Porque as ideias dificilmente se mudam. Nem se combatem. Discutem-se, simplesmente, porque da discussão nasce a luz.

É hoje que começa a tão prometida vida nova que tanto está a excitar-me.

 

 

14 Jun, 2011

Cheira a manjericos

 

Parece que o nível de mexericos que andam no ar tem baixado substancialmente nos últimos dias, tanto quanto se pode avaliar por aquilo que me cheira, quando entro em locais onde habitualmente se notava um cheiro pestilento. Pode ser que isso seja para manter, a menos que atrás de mosquitos venham moscas.

Também pode acontecer que estejamos apenas num interregno proporcionado pelos festejos dos santos populares, no caso, o Santo António que, tudo o indica, está a gerar um casamento fácil, dizem que muito fácil, mas que tem necessariamente de meter umas provas e contraprovas de fidelidade.

Há quem diga que não se trata verdadeiramente de um casamento, em que há sempre aquelas dúvidas de vai dar certo ou vai dar em separação, a curto ou a longo prazo. Não. Trata-se, dizem, de uma reposição de um ajuntamento que terminou mal, depois de ter começado bem. Tudo indica que, também agora, vai começar bem.

O nível de mau cheiro também pode dever-se ao aumento do bom cheiro dos manjericos e, porque não, da sardinha assada que anda próximo deles. Depois, o Santo António fechou a cidade de Lisboa, mandando muitos mexericos para o Algarve, deixando para trás um ar muito mais puro e saudável cá para cima.

Como é normal, com o ambiente mais puro, diminui logo a quantidade de moscas que temos de sacudir, apesar de haver sempre quem insista na velha treta de que mudam as moscas, mas onde elas poisam não muda nada. Sinceramente, não quero contribuir aqui, para aumentar o nível do pivete real ou imaginário.

Detesto mexericos mas adoro manjericos. Mas que fique bem claro que gosto dos manjericos dos santos populares, mas detesto tanto ou mais que os mexericos, aqueles manjericos que durante o ano inteiro passam a vida a mexericar com o que ouvem, o que não ouvem e, sobretudo, com o que inventam.

Mas, por esta altura do fim dos festejos de Santo António, tem sido um descanso. Um ou outro zunzum de moscas isoladas, não têm conseguido manter no ar, o cheiro pestilento que sempre adoraram. Depois, tenho de reconhecer que até há moscas que têm reuniões, onde ficam presas e impossibilitadas de fazer outros zunzuns.

Santo António casamenteiro não conseguiu, até ao final do dia da sua consagração, que se trocassem as alianças e fosse abençoada a união dos nubentes mais desejada de que tenho memória. Provavelmente, sou eu que tenho a memória muito curta, porque o santinho não tem problemas desses. 

Mas têm os noivos, porque sabem muito bem naquilo em que falharam na última vez, e acabam de reincidir agora, ao renovarem um acordo copiado à pressa, para que a viagem de núpcias à tão amada Europa, não fique prejudicada por uns dias de adiamento. Contudo, ficará prejudicada, e bem prejudicada, porque os noivos não terão tempo para uma comemoração nupcial tão romântica quanto o devia ser.     

Depois, passado o Santo António, com os manjericos encerrados em Lisboa ou exilados para o Algarve, está mais que comprometido o S. João, com essa viagem enjoativa ao reino das desilusões. Que começarão por aí. Quando chegar o S. Pedro, já perto do fim do mês, não será de estranhar que se volte aos mexericos.

Até porque nessa altura já não haverá cheiro a manjerico que disfarce a invasão de moscas e mosquitos que nos vão lixar o ar que respiramos. Tudo porque o novo circo já terá sido montado, o círculo estará menos arredondado e o ciclo já terá mudado. Só não terão mudado as moscas, chatas, sujas e mexeriqueiras.

Contudo, já me sinto feliz por me ter sido proporcionado um Santo António relativamente limpo de mexericos e de manjericos incómodos, abafados pelos manjericos bem cheirosos.

 

 

Pág. 1/2