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afonsonunes

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Contrariamente ao que sugere o título prometo que não vou falar do fado. Simplesmente, porque o nosso fado está traçado e, segundo a nobre tradição, ele não prescinde de nos deixar tristezas, nostalgias e lágrimas, apesar do fausto e a abastança de muitos dos seus locais, onde o povo que o viu nascer não tem entrada.

Certamente que não é por causa dos vinte e três por cento do IVA na factura, pois até gostava de saber quantos por cento dos estabelecimentos de fado, de restauração, de comércio e de tantos outros, não entregam um chavo daquilo que cobram. Cá para mim, o aumento é mais uma estupidez, pois devia era ver-se quem não cumpre a lei e zás.

O zás quer apenas dizer que a porta devia ficar mesmo fechada em caso de fraude, porque a concorrência devia ser limpa, leal e séria. Mas, por outro lado, não compreendo lá muito bem a indignação, o susto, dos que sabem que não cumprem, e são muitos, quando quem paga é o cliente. Essas histórias dos despedimentos, do fecho, e outras, são outra história.

A TAP vai ser privatizada e os pilotos vão ter de mão beijada uma participação na venda e na administração. Coisa linda de se ver. Eu também quero, pois tenho sido eu a ajudar a pagar os balúrdios dos prejuízos que ela tem dado ao longo dos anos. E ainda por cima nunca tive ordenado de piloto, nem pilotei nenhum dos balúrdios de interesses voadores.

Temos assistido a um braço de cera entre um chico esperto de nome Coelho e um anjinho chamado Seguro. Tudo por causa de umas folgas que não existiam mas que, afinal, sempre foram detectadas e aparafusadas, segundo o chico, e mal eliminadas segundo o seguro. Resultado, parafuso a menos por parte do esperto e um seguro com a folga estragada.

Parece que tudo se resumiu ao facto de ter havido a perspectiva de se terem juntado em parte incerta para um cafezinho. É que esta coisa de conversar sem molhar a garganta não dá. Mas o grande problema foi o facto de S. Bento ser relativamente distante do Rato. E, viaturas, é coisa que não há. Viaturas condignas, claro, porque chaços há por lá muitos.        

Já me constou que o BPN e o BIC vão mesmo juntar os trapinhos e formar um potentado da banca mundial. Eu, entendido na matéria, não acredito. Então, se o BPN que ficou sem milhares de milhões que voaram para bolsos conhecidos, se recebeu milhares de milhões que foram para desconhecidos e se o BIC se desfalca em quarenta milhões, pode lá ser?

O INE agora também lhe deu para lançar a confusão no país. Então não anda a espalhar por aí que a confiança das pessoas e das empresas nunca esteve tão baixa como agora? Mas isso pode lá ser? Então essa confiança não tinha já batido no fundo há muito tempo? Querem agora fazer-me crer que ainda se pode descer abaixo do fundo?

Esta do fundo faz-me lembrar aquela dos recordes do desemprego que foram sendo batidos quase de mês para mês, como um feito só possível num contexto político muito pessoal, muito cor-de-rosa, que era preciso mudar. E mudou mesmo para um contexto laranja, sabe-se agora, muito ácida, com os recordes a serem batidos de semana para semana.  

Assim sendo, cheguei àquele ponto em que estou como o povo que diz que já nem S. Pedro nos vale nesta afronta. Só que eu ainda vou recorrer a uma devoção muito especial que tenho por um santinho oculto. Não, não é nenhum santinho de pau carunchoso, não senhor. É o S. Pedro de Massamá, a quem o povo já começa a fazer promessas.

Já tivemos uma mulher que se transformou em símbolo da Pátria numa televisão. Já tivemos quem, por ela, se tivesse transformado em traidor à pátria. Já tivemos banqueiros a fazer um assalto de cara destapada ao seu próprio banco. Já temos um herói na cadeia. Ainda temos um herói que nunca mais sai da câmara para a cadeia. Não merecíamos tanto.

Certamente que não é por isso que anda tudo desmotivado. Mas também não é por causa dos que trabalham de menos e recebem de mais. Nem dos que vão apaziguar lutas e levam na cabeça. Nem dos que nos deviam governar e nos entregam a quem nos esfola. Nem dos que deviam prender malandros, mas não têm tempo.

O país está transformado num leilão gigantesco. Tenta-se vender casas, carros, propriedades, enfim, tudo o que agora não me lembra. Parece que penhoram as coisas às pessoas para que elas as comprem a seguir. É uma injustiça, como tantas outras. Esquecem que essas pessoas foram proibidas de ir buscar mais dinheiro ao banco. Não é justo.

Portugueses, juntai a vossa, à minha voz. Águias, leões, dragões, nos vossos actos solenes, mostrem o que valem. Gritem em uníssono: Não querem mais nada? Não façam cerimónia. Não se envergonhem. A gente dá, de boa vontade, tudo o que vós quiserdes. É só pedir.

 

 

29 Nov, 2011

Privatizem-se

Parece-me que é chegada a hora de o governo se privatizar antes que se lembre de privatizar o país na sua totalidade. Não é difícil verificar que já pouco falta, se atendermos à suculenta lista de tudo o que está pronto a mudar de mãos para satisfazer a gula insaciável dos senhores que não querem roubar os cidadãos por via directa.

Para lá dessa gula que se revela um mar de apetites e tentações, aparece a ela associada uma sede incontrolável, aliás, altamente justificada com o facto de que quem muito come, tem uma necessidade ainda maior de beber. Assim se justifica que, num país com tanta pobreza, haja tanta gordura balofa neste paraíso dos privados.    

A primeira razão que justificaria a privatização do governo prende-se com a insidiosa aversão que tem demonstrado em relação a tudo o que é público e a simpatia indisfarçável que nutre por todas as actividades privadas. Estas opções são mais que suficientes para que se modifique completamente o conceito de governar o país.

A segunda razão tem a ver com a entrada dos agora novos governantes internacionais infiltrados que, à vista desarmada, ditam as leis que nos asfixiam, tornando totalmente desnecessário um governo interno que apenas serve de intermediário na aplicação dos castigos ao sector público e nas benesses ao sector privado.

A terceira razão é facilmente fundamentada com o facto de não precisarmos de um governo que só tem servido para nos deitar areia para os olhos desde o primeiro dia após a sua tomada de posse. E refiro só a partir desse dia, pois o que fez antes nesse sentido, não o fez como governo, porque ainda o não era. Mas fez muito como se já o fosse.

Questiono então para que preciso eu de um governo que dirija o estado se, na verdade, ele não dirige senão os interesses dos estrangeiros e, com a orientação destes, os superiores interesses dos privados. Daí que seja urgente e necessário que o governo seja privatizado para que não tenha que meter o bedelho no sector público.

Aqui, os funcionários, do mais pequeno ao maior, que é como quem diz, ao maior dos menores, viveriam de uma tabela de taxas a cobrar aos privados pelos serviços que lhes prestariam, naquelas áreas em que eles não quisessem pegar. Claro que aí, teriam de pagar com língua de palmo, pois está-se mesmo a ver o que eles não queriam, ainda que de borla.

Como é evidente, os funcionários seriam uma espécie residual na sociedade, logo, isenta de todos os impostos e de compromissos com os estrangeiros, substituindo nesse privilégio os que até agora nada pagavam. O país seria uma enorme propriedade privada, tão grande como a enorme dívida que contraiu e iria ter de pagar sem os bolsos dos funcionários.

É evidente que os reformados e os pensionistas também seriam privatizados, que mais não fosse porque as actividades que podiam praticar não estão incluídas nas tabelas de preços a cobrar pelos funcionários. Além disso, eles apenas poderiam dar serviços mínimos e, por esses, ainda teriam de pagar para os fazer. 

Depois de privatizados, esses funcionários, que nunca mais pensem no dinheiro que descontaram ao longo de uma vida de trabalho. É bem conhecido que estes sujeitos de agora, não querem saber do que foi a vida antes deles. Só querem saber e bem, qual a melhor maneira de sacar tanto, ou mais que os outros, agora por métodos muito melhores.

Não vale a pena perderem tempo a reclamar direitos. Isso já era. Mesmo o pessoal do privado que ainda trabalha, escusa de protestar por estar a descontar para uma reforma que já sabe que não vai ter. Tem apenas que se preocupar em manter o trabalhito com o ordenadinho da praxe. Podem tentar uma queixa para o tribunal lá de fora mas é tempo perdido.  

É sabido que no privado é preciso dar o litro, mesmo sabendo que se não leva para casa mais que meio quartilho. Portanto, quem quer descanso, não come, poupa. Quem quer trabalhar, ou continuar a trabalhar no público, já sabe que, mais dia, menos dia, vai ser privatizado. Portanto, só tem que aceitar as regras e, juizinho.

Agora a minha grande esperança para o desenvolvimento sustentado e integrado do país, ai isso não há qualquer espécie de dúvida. O governo que se privatize. Quanto mais depressa melhor.     

 

 

 

As palavras são como as cerejas porque, comendo uma, essa puxa sempre por outra. Gosto de ler o que por aí se escreve, acima de tudo, porque sou confrontado com as mais diversas opiniões, coincidentes umas, contraditórias, outras. Depois, interessantíssimos, são os comentários que tudo isso gera. De amigos, de conhecidos e desconhecidos.

Neste período político de abundante nebulosidade, é natural que quase tudo seja encarado como uma superfície frontal que se instalou por cima das nossas cabeças. Dela resulta que sejamos atingidos por períodos de chuva de palavras, mais grossa ou mais fina, além de levarmos, por vezes, com uns relâmpagos de trovoadas dispersas que toldam a vista.

Normalmente, muito do que se passa, se deve ao que dizem os que mandam chover, apesar de também terem os seus erros meteorológicos, bem mais gravosos que os dos meteorologistas que nos enganam com previsões diárias de bom tempo. Mas são os manda chuva que nos pregam as secas que uns adoram, outros detestam.

Ora aqui é que está o busílis da questão. Tomo como exemplo, o incontornável tema da austeridade. Vem o governo e repete até à exaustão que não há alternativa às medidas que tomou. Que aceita sugestões ou propostas, mas vai logo avisando que não aceita discutir o que não consta das suas decisões.

Porque, afirma, elas são sérias, realistas e necessárias. Penso que ninguém de boa fé, neste momento da nossa triste vida colectiva, pensa que podemos continuar a vida que temos levado. Penso que, como já foi dito por muita gente, nunca um governo teve tanto apoio à imposição de medidas duras como este.

Mas, então porque se movimenta tanta gente de todos os níveis, contra este estado de coisas que o governo não aceita discutir abertamente, sempre com a teimosia de que tem de ser assim mesmo e ponto final. Não se trata de birras de oposições ou malabarismos eleitoralistas, pois basta olhar para as personalidades que se pronunciam.

Do presidente, a gradas figuras do principal partido do governo, o tom é muito crítico, para não falar de gente com créditos firmados na Europa e no mundo. Teremos então de pensar que todos eles são irrealistas, ou que todos têm interesses ocultos, para acreditar que apenas o governo e os seus apoiantes são infalíveis e isentos nas suas visões da situação?   

Sendo a austeridade essencial e aceite como tal por quase toda a gente, temos de nos voltar para a forma como ela está a ser imposta. E isso tem que ver com quem mais a paga, ou seja, quem é mais sacrificado com as medidas encontradas para a pagar. Tem a ver com a já falada equidade, mas parece que ela assusta muita gente.

Gente que lhe convém ir sempre ao encontro do óbvio. A necessidade, a obrigação, o patriotismo, a sobrevivência e não sei que mais. Falem da equidade, convençam os críticos da sua existência e da razão de ser da não inclusão nos sacrifícios, dos que mais contribuíram para esta catástrofe que atingiu o país, que são aqueles que mais contribuíram para ela.

Que houve muitos erros no passado, houve, mas então ninguém se excluiu de participar neles. Que continua a haver muitos erros no presente, há, mas o pior de todos eles, é a imposição de que sejam sempre os mesmos a pagá-los. E é isso que se contesta, muito justamente, com consequências muito mais gravosas do que pensam os que não querem ver.

A prova disso mesmo, é a espiral de violência que se vai desencadeando por todo lado, enquanto agora, ainda se olha apenas a indisciplina que, dizem, não só não resolve nada mas, até prejudica. É verdade, se não olharem para os sinais que nos mostram. Procurem as causas, e verão como se ganha tempo, dinheiro e razão, se demonstrarem abertura e lealdade.

Porque essa argumentação de que quem ganha eleições tem legitimidade para tomar todas as medidas que entende, mesmo que diga que são imprescindíveis, só tem razão de ser se for totalmente cumprido o programa sufragado. Basta referir o último governo, que não cumpriu o mandato para que foi eleito.

Neste momento, não é difícil pensar que é o governo que se comporta como se estivesse a lutar contra inimigos imaginários. Inimigos que o governo, na verdade, não tem. Basta que saiba distribuir os sacrifícios com a tal equidade.  

 

 

23 Nov, 2011

Vamos dormir

Neste dia de quinta-feira vinte e quatro do onze do onze, vou fazer aquilo que muita gente andou a fazer durante muitos anos e que, provavelmente, ainda haverá quem faça, com a desculpa de que não tem para fazer. Pois eu, que sempre tive o vício de trabalhar, vou para a caminha e espero dormir o dia todo.

Isto, se não fizerem muito barulho na rua, com o argumento de que neste dia é proibido fazer seja o que for, excepto barulho. Muito barulho, para lembrar a quem está a fingir que trabalha, que mais vale dar dois murros na mesa e vir para a rua juntar-se aos que não têm sono, nem vontade de deixar dormir os preguiçosos.

Só ainda não sei como vou resolver o problema das minhas refeições pois, certamente, vai ser muito difícil encontrar quem me venha trazer o pequeno-almoço à cama. Até porque também não estou a ver quem se atreva a acender o fogão, o meu e o dos outros lá fora, nem que seja para aquecer um simples copinho de leite.

Portanto, estou com muito receio que não possa estar todo o dia deitado na cama sem pequeno-almoço e, se isso acontecer, tenho quase a certeza de que não conseguirei mesmo dormir o dia todo. Sobretudo, quando chegar a hora da sopinha e do meu pratinho de batatas fritas com qualquer coisa que não dê muito trabalho a mastigar.

Mas, é ponto assente que eu não quero fazer nadinha neste dia, senão teria de ouvir a minha consciência a chamar-me traidor da classe trabalhadora, lembrando-me que o meu dever incontornável é morrer de fome, se não puder resistir, pois é preferível morrer como herói de uma causa justa, que sobreviver através de uma traição.

Aliás, tenho um argumento a meu favor. Não sou capaz sequer de fritar as batatinhas, quanto mais descascá-las e cortá-las ao jeito de as meter no óleo. Ou no azeite? Ora, quero lá saber, se não vou fazer nada disso. Quero mesmo é dormir descansadinho, se me deixarem e se a fome não me começar a fazer comichão na boca do estômago.

Agora tive uma ideia luminosa e ia preparar-me para ir à rua e abastecer-me, nestes minutos que faltam para me meter debaixo dos lençóis. Não resisti a dar um soco na cabeça, em sinal da minha estupidez nata. Nem sequer devia ter pensado nisso, pois é sabido que antes da meia-noite já está tudo fechado a sete chaves.

A propósito, como é que todas as outras pessoas, milhões delas com certeza, irão resolver este problema. Mas porque é que eu não pensei nisso mais cedo. É o que eu digo, ando sempre a aprender coisas depois de já não precisar delas. Mas, realmente, os restaurantes, os cafés e as tascas, devem ter de blindar bem as portas por causa dos assaltos.

Sim, porque a fome é negra. Já estou a relacionar porque razão já se falou em tumultos nas ruas, com os governantes a prometer que não havia motivos para que os cidadãos estivessem com medo. Ao fim e ao cabo, um pouquinho de fome não faz mal a ninguém, pois o maior problema não é a fome: é o excesso e a fartura.

Por isso é que os governantes também têm aconselhado os cidadãos a que cortem nas gorduras, em lugar de só pensarem em encher a malvada a toda a hora. Mas há uma coisa que me anda cá a fazer uma grande confusão. Julgava eu que os governantes também eram cidadãos mas, perante o que vejo, parece-me que não.

Bom, estou a falar de cor e isso não é bonito. Ninguém me garante que eles não vão fazer o mesmo que eu, repetindo o que, provavelmente, mais fazem todos os dias. Apesar de não estar certo do que penso, não vou deixar de ser obediente e respeitador dos meus deveres de cidadão cumpridor, não fazendo barulho e dormindo sem incomodar ninguém.    

Por isso é que eu já estou resignado. Vou mesmo já para a caminha e que ninguém me chateie até daqui a vinte e quatro horas. Se tiver fome e não dormir, fico contente porque, pelo menos fiz um esforço pelo bem do meu país. 

 

 

22 Nov, 2011

Peninsulândia

 

Os nossos irmãos espanhóis vivem dias de euforia por se terem visto livres de um governo que, dizem eles, os conduziu à situação actual do país. Estou farto de tentar lembrar-me, sem o conseguir, onde foi que eu já ouvi a mesma coisa. E estou convencido que eles também já ouviram essa coisa, embora numa voz um bocado sumida, lá ao longe.

Sem querer dizer que eles, os nossos irmãos, são muito ou pouco esclarecidos, tenho impressão de que são capazes de padecer um bocado de surdez, ainda que naquele estado pouco notório. Mas, já há quem note aquele sintoma inicial, que é a fase de estar frequentemente a perguntar, ‘o quê?’, aos seus interlocutores.

Ora, isso tem acontecido sempre que alguém lhes fala em grego, em português ou, ultimamente, em italiano. Não é porque eles não dominem esses idiomas, pois eles até são poliglotas. É, simplesmente, porque eles são dos tais que só ouvem o que lhes convém. E então quando lhes dizem para olhar para os seus irmãos, eles dizem logo, ‘quem?’

Mas, lá muito no fundo, eles até nos respeitam muito. É ver como fizeram agora lá, o que nós fizemos cá, há uns meses atrás. Festejaram com o mesmo entusiasmo, como se a vida deles tivesse mudado da noite de domingo para a manhã de segunda-feira. E vão, com certeza, continuar a festejar durante mais uns meses, imitando as nossas continuadas alegrias.

Para nós, portugueses, isto é uma bênção divina. Já havia quem andasse um pouco desanimado por ter de festejar com algum isolamento, porque somos poucos, não dando para fazer as coisas em grande. Agora, com todos os nossos irmãos connosco, a festa tem tudo para ser de arromba.

Tempos houve em que já se admitia a hipótese de nos juntarmos aos nossos irmãos, porque isto por cá estava mau e lá até estava muito bom. Não será caso para dizer que as coisas se viraram do avesso mas, a verdade é que eles, os nossos irmãos, resolveram massivamente fazer exactamente o que nós fizemos.

Portanto, a minha sagacidade diz-me aqui ao ouvido que eles, os nossos irmãos, estão desejosos, mesmo ansiosos, por se juntarem a nós, fazendo da península o grande bastião de desenvolvimento da economia alemã, antes que ela própria dê o berro e, então, não haveria península que resistisse ao dilúvio.

Os nossos irmãos já andavam assustados com os cânticos que vinham dos lados dos Pirenéus, na medida em que a leste deles, a música era totalmente dissonante. É que os franceses e os alemães, embora muitas vezes desafinados, lá convenceram os portugueses a fazer coro com eles. É fácil imaginar como se sentiam os espanhóis no meio destes, mesmo sem os italianos.

Entre nós e os espanhóis há todas as condições para uma união de facto. Até já ouvi dizer que eles já arranjaram dezassete jardins iguaizinhos à nossa Madeira. Só ainda não conseguiram arranjar dezassete carnavais iguais aos do nosso jardim. Mas, quanto à música que se ouve em todos eles, parece que não se vislumbra qual a maior desafinação.

Aqui, na já arquitectada Peninsulândia, está a desenvolver-se o maior projecto franco-alemão de combate à falência do sistema bancário europeu e, consequentemente, de combate à riqueza excessiva dos pirosos da classe média. É preciso, pode ler-se no projecto, tirar-lhes a presunção de que são ricos, metendo-lhes a pobreza à frente dos olhos.

Daí que sejam eles os escolhidos para pagar a factura da reposição nos bancos, dos fundos que outros de lá desviaram para fins eminentemente de apoio a famílias altamente carenciadas de vergonha na cara. Além de peninsular e franco-alemão, é um projecto que isenta as elites de se meterem nisto, além dos que já deram tudo o que tinham a dar.   

É evidente que um projecto desta dimensão tem de ter uma sede à altura da grandeza da Peninsulândia. Daí que já esteja assente que ficará em Oeiras City, naqueles terrenos imensos que se descobriu agora que não tinham dono. É por isso que o eixo franco-alemão vai passar a chamar-se simplesmente, ‘Eixo Berlim Oeiras’. 

Mas, o projecto visa outros horizontes. Num futuro próximo, arranjar derivações para Atenas e Roma, onde os preparativos para as festas ainda estão à espera de verba. Depois, numa segunda fase, para Viena e Bruxelas, onde já se ouvem os foguetes da alvorada. Mais tarde, para toda a Europa, com a França e a Alemanha a serem os bombos da festa.

Está mais que visto. Acabou-se a nossa solidão, sempre na cauda de tudo. A Peninsulândia vai fazer de nós, um dos maiores da Europa. Vamos tratá-los todos por tu e dar-lhes conselhos. Mais, de quando em vez, mandamos-lhes recados.   

 

 

20 Nov, 2011

Roubos vitalícios

 

Roubar é uma coisa que muita gente sabe fazer. Roubam uns à descarada, roubam outros com muita ciência e até há quem seja verdadeiro especialista na arte de bem roubar. Verdade seja dita que também há quem roube inocentemente, porque são tantos a roubar que, às tantas, a roubalheira parece ser a melhor maneira de parecer ser sério.

Os inconscientes acham que roubar é uma maneira de colaborar com os amigos ou conhecidos, como se sentissem estar a ser solidários com quem acha que não tem o que merece e vai daí, toca de meter a mão onde lhe parece que o produto do seu roubo não adianta nem atrasa quem fica roubado.

Hoje não estou voltado para os profissionais do roubo, os que assaltam bancos e casas com mais ou menos violência, pelo que os deixo em paz, como fazem alguns profissionais que estão no campo oposto. Hoje só me apetece falar de gente séria que rouba, não para sobreviver mas, simplesmente, para viver melhor que ninguém.

Gostava de saber quantas pessoas no país têm aquela coisa que se chama subvenção vitalícia, ou reforma vitalícia, porque desempenhou um serviço altamente remunerado, mesmo por muito pouco tempo, e que é acumulável com vencimentos no sector público ou privado, bem como com outras reformas de qualquer espécie.

Dadas as circunstâncias em que o país e os portugueses se encontram, aquilo não são subvenções, nem pensões, nem nada. Aquilo são roubos à pobreza de todos aqueles que querem ganhar alguma coisa e não os deixam. São roubos à solidariedade que é devida a todos os cidadãos que trabalham e lhes roubam parte do produto do seu trabalho.

Como roubo é tirar parte de uma pensão para a qual se trabalhou toda a vida. Ora, essas subvenções vitalícias, que são legais, como é evidente, não serão mais legais que os vencimentos e reformas dos trabalhadores. Logo, quando as leis não são aplicáveis a todos os cidadãos da mesma maneira, alguém está a ser roubado. Por culpa de quem fez as leis?

É isto que me leva a deitar assim umas contas por alto, as quais, apesar de eu ser muito baixo, não devem andar muito longe da exactidão. Assim, diria eu que neste país de ladroagem, andam para aí uns milhões a trabalhar e a pagar impostos, para que o estado dê, de mão beijada, subvenções, pensões, subsídios, cartões, senhas, a milhares que só sabem gastar.

E que, de tudo o que lhes dão, ainda se livram de pagar impostos, com legalidade ou sem ela, mas que fogem dos impostos como o diabo da cruz, é uma certeza que ninguém quer confirmar. Depois, dizem-nos que são poucos, que não é por aí que o problema se resolve. Pois eu digo que era por aí que o problema se começava a resolver.

Porque sempre ouvi dizer que, onde todos pagam, nada custa a pagar. É assim que surge aquela mensagem tão ouvida hoje por todo o lado: ‘ai ele é isso?’ Então não resta outra hipótese senão fazer o mesmo que eles. Certa ou errada, esta teoria contribui muito para a degradação do clima social de que tanto se fala.

Seja lá para o que for, todos entendemos que temos obrigação de contribuir, desde que o possamos fazer na exacta medida em que o nosso esforço contributivo não esteja desproporcionado em relação aos restantes cidadãos, cada um na exacta medida das suas possibilidades e não no estatuto social de que goza ou usufrui.

O que eu lamento profundamente é que toda a gente que goza desse estatuto especial, fale de tudo e mais alguma coisa como soluções para o problema, mas esquece sempre estas situações intocáveis de roubos, quando comparadas com os do estatuto da arraia-miúda, onde tudo se pode cortar, no caso, roubar, mesmo sem dó nem piedade.          

Que os interessados não falem desse mistério ainda entendo. Já não se compreende que os partidos que dizem estar sempre do lado mais desprotegido da sociedade, tal como corporações e associações que tanto apregoam solidariedade, não reparem nesses roubos vitalícios que são autênticos vícios incorrigíveis.

 

 

 

18 Nov, 2011

Saltos e assaltos

 

O nosso país foi vítima de um assalto à vista desarmada por três caras destapadas que, por enquanto, dizem que deixam a garantia de uns tantos mil milhões que virão de tempos a tempos. Mas, o que eles levam já, sem serem perseguidos pelas nossas autoridades é a faculdade de proferirem o sermão que ninguém lhes encomendou.

É mais que sabido que o produto desse assalto se vai cifrar numas centenas de milhões a cobrar lá mais para diante, quando os nossos bolsos não escorrerem mais que uns míseros cêntimos. Como a minha inteligência não é muito arguta, tenho alguma dificuldade em prognosticar de onde irão eles tirar essa massa toda.

Já não nos bastam os constantes assaltos com caçadeiras curtas, com pistolas a sério ou a fingir, com carapuços ou com lenços na cara, ainda temos de levar com estes engravatados que até têm cara de quem não faz mal a ninguém. Ao contrário dos outros, estes têm a vantagem de nos assaltarem com a nossa concordância, melhor, a pedido dos de cá.

Mas, nem tudo são vantagens, bastando atender ao tempo que duram esses assaltos. Aqueles a que já estávamos habituados não duram mais que um minuto e toca a cavar que se faz tarde. Os assaltantes que vêm de fora demoram uma eternidade a fazer um só assalto, em várias voltas, mas muito mais agressivo, apesar de mais lento no tempo.

Tenho a certeza que há muita gente que, como eu, preferia aquela vidinha de há uns tempos atrás, em que lá tínhamos um assalto ou outro, de vez em quando, sem nos irem ao fundo dos bolsos. Mas deixavam-nos pensar pela nossa cabeça e até não se importavam mesmo nada que andássemos a fazer figuras tristes. Mas era a nossa vontade.

Abro aqui um parêntese para salvaguardar a hipótese remota dos tais clientes ou donos do BPN serem forçados a entregar o que lá foram buscar à socapa. Para isso, teriam que nacionalizar parte de Cabo Verde, além de várias propriedades privadas em muitos locais de todo o país. Mas isso é muito difícil, por constituir um monstro de mega processo.

Depois, trata-se de gente que soube dar o salto para um escalão social que não está ao alcance de quem pretende deitar-lhe a mão. Com a agravante de que, quem tinha possibilidade de lhes deitar a mão, já apertou essa mesma mão muito amistosamente, se é que não teve mesmo a honra e o privilégio de já lhe ter ido ao beija-mão.

De qualquer forma, os assaltantes à vista desarmada não vão ficar de mãos a abanar depois de concluído o trabalhinho trimestral que, se for preciso, passará a mensal, ou mesmo quinzenal, se os saltos se forem revelando curtos demais. Mas isso depende apenas da sua incomensurável sabedoria em visar cheques.

Na qualidade de país assaltado resta-nos apenas implorar a misericórdia divina para que os assaltantes não sejam demasiado cruéis, sujeitando-nos à condição de assaltados permanentes e, cumulativamente, à submissão a todos os assaltantes internos que, com os de fora, mantenham uma estreita cooperação.

Este parece ser o maior perigo que nos espera. Não porque nos vejamos privados de mais ou menos dinheiro que, de qualquer modo, deixaremos de ter. Mas corremos o risco real e mais que provável, de ter-mos de nos sujeitar a transformarmo-nos em assaltantes de baixo valor para podermos manter a pele em cima dos ossos.   

Há por aí quem fale em dar o salto, como forma de fugir a esta triste sina de ser assaltado permanentemente ou, em alternativa, andar por aí promiscuamente a assaltarem-se uns aos outros. É bastante claro que isso de dar o salto já foi chão que deu uvas. Ninguém é capaz de arranjar um lugarzinho seguro para onde se possa ir descansado.

Provavelmente, a grande maioria dos portugueses até aceitam que não temos outro caminho, agora, que não seja sujeitarmo-nos a este salto de cavalo para burro. O que muitos não compreendem é a razão porque não se toca nos bolsos dos que voam ou voaram muito de avião, ou se deslocam por terra em máquinas voadores sobre rodas, tudo saído do OE.    

Portanto, a única hipótese que nos resta, aqui ou em qualquer lado, é aceitar esta vida de sobressaltos. Mas aqueles que nos meteram nisto, também não escapam a essa hipótese, com a agravante de que esses vão estranhar muito mais a situação.  

 

 

14 Nov, 2011

É já a seguir

 

Nem sequer vai haver tempo para fazer propaganda ao método infalível do senhor Álvaro para apurar exactamente o mês, o dia e a hora em que se inicia, precisamente, o início do fim desta malvada, que nos está a comer as reduzidas gorduras que ainda temos debaixo desta roupa de inverno, que também ajuda a que essas gorduras pareçam maiores.

Sabemos já que o tão desejado início vai acontecer no próximo ano, embora o senhor Álvaro não tenha ainda especificado se será no início ou no fim. Convém não confundir o início da malvada com o início do ano e muito menos com o início do seu anúncio, o qual pode vir a originar o início de um esclarecimento sobre o fim do dito início.

Mas, é já a seguir que ficamos a saber da boca da verdadeira simpatia do senhor Álvaro, que o país pode acreditar nele, pois dá como garantia, ter acabado de ‘telemoveliar’ para a Califórnia, de onde recebeu a notícia, que vai pôr todo o país em alvoroço, de que alguém traz de lá o certificado de que os portugueses nunca se vão ver gregos.   

Ora, com esta certeza, o senhor Álvaro, com aquele sorriso de felicidade, está em condições de sossegar todos os portugueses, especialmente aqueles que simpatizam com ele sem reservas, quanto à vitória das forças do bem sobre todas as forças do mal, que têm andado a ‘engalinhar’ o país, sobretudo nestes últimos meses.

Mas, não desliguem, porque é mesmo já a seguir que poderão ouvir, de viva voz, o senhor Álvaro anunciar que já informou Massamá, das suas importantes decisões, em consequência da boa nova que recebeu da Califórnia mas, que não fiquem dúvidas, essa boa nova também resultou da sua capacidade de intervenção na malvada.

Ora, é muito natural que, depois de anunciado o início do fim da citada malvada, o senhor Álvaro dê já, de boa vontade, um lamiré ou uma dica, sobre o meio da dita, isto, se ele ainda não conseguir, neste momento de esperança, melhor, de certeza, para quando espera o fim definitivo desta malvada que tanto nos está a baixar o cachaço.

Garanto que é já seguir que o senhor Álvaro vai esclarecer definitivamente quando é que os funcionários públicos vão ter o privilégio de continuar a festejar o vinte e cinco de Abril e o primeiro de Maio, sem aqueles discursos chatos de alguns camaradas, dando-lhes como alternativa umas sandes de fiambre e cerveja nos locais de trabalho.

É bom não estarem já a desconfiar que vão ouvir outros discursos enquanto comem e bebem, pois ali é tudo gente de palavra, que nunca enganou ninguém, nem nunca vai enganar, porque o tempo dos enganos já lá vai, embora o tempo das verdades também por lá tenha ficado. Sim, porque neste momento, o senhor Álvaro só pode prometer, perdão, dar realismo.

Por isso é que é já a seguir que ficaremos a saber tudo aquilo que nunca nos passou pela cabeça. Sim, porque ninguém alguma vez pensou que estamos num país onde vale a pena viver. Tal como nunca tivemos a garantia de que temos um país viável, e isto não é retórica. O senhor Álvaro já ouviu isso e não desmentiu, logo, é mesmo real.

Mas, muito mais importante ainda, é termos agora certezas, quando ainda há bem pouco tempo só tínhamos dúvidas. Não, agora temos dados bastante fiáveis que podemos cruzar através da Califórnia, mas também de Massamá. Tudo confirmado e reconfirmado pelo senhor Álvaro, que está nos arredores, como não podia deixar de ser, isso, de Massamá.

Peço desculpa, mas houve aqui um pequeno lapso da minha parte. Afinal, não é já a seguir que o senhor Álvaro vai falar. Ouvi agora dizer que já falou. Caramba, como é que eu não ouvi. É imperdoável. Perdi tudo o que mais desejava ouvir.

 

13 Nov, 2011

Poupem-nos

Permitam-me que comece com aquela barbaridade que oiço todos os dias da boca de governantes de agora, aliás, como já ouvia de governantes anteriores, melhor, de governantes de todos os tempos: o país não compreenderia se não fizéssemos assim. Lá na deles, fazer assim, é fazer da única maneira que eles admitem.

Muito gostam os governantes de falar em nome do país, que o mesmo é dizer em nome dos portugueses, quando não os ouviram minimamente, ou mesmo quando sabem perfeitamente que os portugueses não concordam com as suas birras estratégicas ou com as suas asneiras mais que evidentes.

Gostam imenso de dizer que não há alternativa às suas decisões. Mesmo que lhe metam pelos olhos dentro que sim, que há, eles inventam mil e um argumentos para não atender a nada nem a ninguém, só porque pensam que seria um acto de fraqueza aceitar a correcção de uma ou outra decisão menos acertada.

Como está muito em voga dizer-se, os recuos provocam um medo tremendo de serem considerados um perder da face perante as contestações, que são vistas quase sempre como braços de ferro que se não podem perder. Sobretudo, o poder, que muito excepcionalmente admite que podia fazer melhor.

Nestes dias em que muito do futuro do país se discute, afirma-se que há disponibilidade para aceitar todas as propostas, desde que não sejam criativas. Logo de seguida, afirma-se que não há espaço para discutir alternativas. Como é evidente, tudo isto tem a ver com meios financeiros que, ao que dizem, não se conseguiriam de outra maneira.

Obviamente que essa coisa do dinheiro para um governo, que é o que está em causa, tem sempre mil e uma maneiras de se arranjar, de se gastar ou de se desperdiçar. Porém, o que é óbvio, é que os governos estão amarrados a compromissos clientelares ou tutelares a que se não podem eximir.

É aí, precisamente, que ficam atados de pés e mãos, ao não poderem mexer nesses compromissos obscuros que vão contra os outros compromissos assumidos e que deviam ser respeitados conforme o mandato recebido de quem os elegeu e que deviam estar acima de todos os interesses marginais.

É indubitavelmente mais fácil tirar um salário a quem depende dele para necessidades básicas, que tirar uma reforma a quem tem várias, algumas de valores e origens escandalosas, quando comparadas com os salários obtidos à custa de muito trabalho árduo. Como se a legalidade de umas, apagasse o legítimo direito dos outros.

Como se, comparativamente, não fosse um escândalo, a acumulação de um cargo público, bem remunerado, com uma ou mais reformas. Como se fosse mais justo ser reformado e estar no activo ao mesmo tempo, que ser trabalhador e ver parte do seu salário a voar para parte incerta e ver a miséria a sobrevoar a sua casa e a sua família.

Como se fosse a mesma coisa cortar no que ganha um funcionário que não vai além da média, ou mesmo muito abaixo da média de vencimentos da função pública, ou não cortar nos salários e reformas que ascendem a muitos milhares de euros mensais, de muitos intocáveis que escapam a todos os sacrifícios. E tantos outros casos que só não vê quem não quer.  

Depois, ouvimos dizer orgulhosamente que os portugueses compreendem a situação e aceitam-na, ao que parece, com muito orgulho, por estarem a contribuir para dias melhores. Sim, estão a contribuir para dias ainda melhores do que já tinham, todos aqueles que deviam ter vergonha da opressão asfixiante a que sujeitam muitos milhares de seres humanos.        

Mas, já que não querem ver as alternativas, que são muitas, ao menos que nos poupem a ouvir impropérios que, por vezes, roçam a dignidade de quem está na sociedade com uma postura, apesar de tudo, muito mais digna do que quem nos provoca a todo o momento.

 

 

12 Nov, 2011

Mais um

Mais um que caiu sem apelo nem agravo, este agora com a surpresa de ser de direita, mas de direita daquela que não se endireita mesmo. Que me desculpem os que se situam nessa ala, mas tenho o mesmo direito de me pronunciar nesse sentido, que eles têm quando se pronunciam sobre a esquerda.

Temos assistido à queda de governos socialistas, caso de Portugal e Grécia, com a Espanha à espera da próxima onda. À primeira vista mas, sobretudo à vista dos que só vêem os seus partidos e as suas ideologias, o problema é do socialismo e da esquerda em geral. Pelo menos essa interpretação serve-lhes de lenitivo para as suas dores.

É por isso que esta queda do governo italiano, e como ele custou a cair, vem contrariar de certo modo essa ideia de que a direita faz tudo direitinho e a esquerda arruína todos os países por onde passa. Esquecem-se de que, no tempo de vacas gordas, tudo é leitinho gostoso e no tempo de vacas magras, não se pode beber senão água.

A gente vai ouvindo coisas de pasmar da boca de quem governa, mas também da boca de quem fala de cor, de quem só vê para o seu lado, ou de quem quer deitar areia para os olhos, sobretudo, para os olhos daqueles que já têm alguma deficiência de visão. Como se não fossem capazes de olhar para essa Europa e para o mundo.

A verdade é que os governos vão caindo e não se vê que isso resolva qualquer das questões que assolam os respectivos países. A verdade é que todos esses países sofrem do mesmo mal e a verdade também é que cada um deles teve personalidades muito diferentes a dirigi-los. Custa a crer que estivessem todos a cometer o crime de governação com dolo.

Como na Europa está em marcha a onda de remodelações governamentais, é de prever que ela se vá tornando avassaladora, chegando ao desplante de ter efeitos de arrasar mesmo aqueles governos que hoje ainda dominam a cena política que, paradoxalmente, na Europa da democracia, eles deitam abaixo uns, e colocam lá quem lhes agrada.

E quem lhes agrada é aquela categoria de defensores do primado do dinheiro, que sejam capazes de, como eles, dominarem, não só a cena política, mas também a cena financeira, única forma de continuarem a garantir a sua subsistência na crista da onda, onde cavalgam a crise dos outros e lhes permite ir escondendo a sua.

E não admira que se chegue ao extremo de serem contagiados, na medida em que o dinheiro tudo compra e tudo muda. Como esses países, ao que parece, não estão muito melhor que aqueles que vão caindo, lá chegará a sua vez de irem beber da mesma água que aqueles que já derrubaram, ou vão derrubar nos próximos tempos.

Também não admira nada que haja governos que vão fazendo uma espécie de rodízio, se não conseguirem fazer melhor que os governos que substituíram. Como as coisas estão a desenhar-se na cena mundial, onde começa a haver indícios de haver quem não escape à tal onda avassaladora, já nada pode surpreender ninguém.

Portanto, recomenda-se muito cuidadinho com certezas que só podem estar carregadinhas de incertezas. Isso das promessas já foi chão que deu uvas e está demonstrado que as do presente, são muito mais virulentas que as do passado. Nem admira, na medida em que tudo tem vindo a ser cada vez mais virulento.

Em boa verdade, a Itália não foi apenas mais um país a tombar perante a onda que galgou o sul da Europa e promete subir para norte. A Itália é a campainha de alarme de que a onda pode ser sinal de tsunami que não escolhe países nem governantes. Que não olha a lados esquerdos nem a lados direitos.

Ninguém pode garantir que a Itália é apenas mais um governo a cair, ou o primeiro dos muitos que se lhe seguirão. Porque ninguém pode garantir que até os governos que sucederam a governos derrubados, não venham também eles a cair, levados na mesma onda dos primeiros.

Os tempos não estão para fanfarronices. Cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém.

 

 

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