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afonsonunes

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25 Abr, 2021

Voz e poder

Diz-se que hoje, dia 25 de abril, é o dia da liberdade. Sim, é o dia da liberdade para se dizer o que apetece a cada um, tal como acontece nos restantes dias do ano. Embora se diga que vozes de burro não chegam ao céu, a verdade é que essas vozes tanto lá chegam hoje como em qualquer outra ocasião.

E não importa que essas vozes sejam de gente ou de animais de qualquer outra espécie. Nomeadamente a dos humanos que, com as suas vozes sensatas ou completamente destituídas de senso, à custa das liberdades incontroladas por quem as emite, a custo toleradas por quem as ouve, ou abusivamente ofensivas para quem se quer atingir, de todas essas vozes houve muito ou pouco nos discursos que abundaram na Assembleia da República, com a participação do Chefe do Estado.

Houve de tudo na variedade e na qualidade dessas intervenções. Repetições verificadas em discursos que nunca mudaram nos quarenta e sete anos que leva de existência a nossa democracia para uns, consolidada, para outros, inexistente. Discursos chatos como a potassa. Discursos feitos para embalar meninos. Discursos envenenados, para hipnotizar velhinhos. Discursos de oradores excitados, para ouvintes adormecidos. Discursos violentos, para gente que aceita tudo. Discursos ‘calminhos’, para quem está bem recostado. E mais o que nos deu o quarenta e sete.

Até houve ofertas de colaboração para mudar o que está mal, sabendo-se que essas colaborações têm o preço de compra de interesses individuais ou de grupo. Até houve vozes que se consideram com legitimidade para mudar o poder, quando o poder não se muda com discursos isolados. Até houve um cravo branco, cravos vermelhos na mão, na lapela e no bolsinho do casaco. Até houve muitos participantes que desdenharam ou detestaram cravos. Há quarenta e sete anos que é assim. Neste dia todos querem mudanças. Mas cada um quer as suas. As mudanças alheias, ficam no ar para daqui a um ano. Para o 48, se um deus maior quiser.

20 Abr, 2021

'Justicializando'

My  Takes 24

 Há quem queira ser grande mesmo procedendo sempre como o mais pequeno dos seres que proliferam na espécie humana. Talvez por essa mania das grandezas acabamos por cair na tentação de os classificar como super seres coisa que eles adoram, por se verem catalogados num patamar fora do alcance social e profissional, mesmo dos mais ilustres e competentes cidadãos.

Obviamente que, com esse estatuto, os super qualquer coisa têm uma grande tendência para se considerar intocáveis, até arrogantes, valorizando em larga escala as suas competências, julgando que tudo o que pensam ou fazem tem de ser considerado como indiscutível. Daí a habituarem-se a não permitirem qualquer escrutínio dos seus atos, nem qualquer crítica às suas decisões.

Não é de estranhar que com o passar do tempo haja quem lhes ganhe medo, mesmo aquelas pessoas que deviam usar o justo e legal travão aos seus desmandos e excessos sobre aqueles que, por qualquer motivo, lhes causam ou causaram qualquer sombra na sua superioridade soberana.

Já tenho citado em outras ocasiões o conhecido ex super juiz espanhol Baltazar Garzón, que em tempos idos, fez da justiça um campo de batalha em que chamou à liça importantes figuras do antigo regime do seu país. Tanto abusou dos seus poderes que um dia foi mesmo corrido da sua temível profissão, que tantos louros colocara sobre a sua temida cabeça.  

Recentemente, no Brasil, o ex-presidente Lula da Silva que tanto lutou contra a sua condenação e prisão por corrupção durante infindos anos, viu agora reconhecido que tudo não passara de uma vil perseguição política, encabeçada por um super juiz, Aldo Moro que, penso eu, ainda não teve a ‘merecida recompensa’ de todos os prejuízos que quase destruíram vidas humanas, nunca mais reconstruidas na sua totalidade.

Porém, são dois casos, Baltazar Garzón e Aldo Moro, que saltam da minha memória como representantes de uma justiça que destrói vidas em vez de as recuperar, castigando criminosos que mataram, roubaram ou arruinaram vidas. Castigar é mesmo para se aplicar a quem a justiça investigou, provou e concluiu que, sem dúvidas, só se mete atrás das grades quem praticou mesmo tudo o que a acusação provou e o julgamento confirmou. Nunca se pode condenar por presunção de crimes só pelo fato de se pensar quer eles existiram mesmo. Porque, na dúvida, a decisão é sempre a favor do réu.

Neste momento, assalta-me o pensamento que me dá volta à cabeça, que pode haver mais algum super juiz que se junte aos dois acima citados que a história nunca esquecerá. Separar o trigo do joio é fundamental em tudo na vida. No caso presente, condenar quem, por tudo o que criminalmente for provado, ilibar por tudo o que concretamente não for provado.    

(20/04/21)