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afonsonunes

afonsonunes

09 Jun, 2009

De esguelha

 

Tenho a sensação de que o país anda de esguelha consigo próprio, ou não fosse bem visível o modo como uma grande parte dos seus referenciais se comportam e transmitem a ideia de que anda tudo de candeias às avessas. Ora, sendo assim, nada mais podemos esperar que, por acidente, ou por suicídio, acabemos por cair no fundo do charco, que até há quem veja nele a sua própria salvação.
Com tanta gente a olhar de esguelha para tudo e para todos, é inevitável que tudo vá parando, para conforto de quem não gosta mesmo de fazer nada e, mais ainda, para quem lhe faz impressão que ainda haja alguém que queira fazer alguma coisa.
Não é possível voltar aos primórdios da civilização, em que ninguém andava de esguelha com ninguém, embora se matassem uns aos outros por dá cá aquela palha. Nesses tempos, quem não se mexesse em busca de comida, bem podia protestar de pau na mão, que não lhe restava mais que morrer à fome.
Hoje, temos civilização, temos regras e temos leis, por vezes tão complicadas, que para mais não servem, que permitir que possamos assistir a caturrices de toda a ordem, de uns senhores que andam permanentemente de esguelha com outros senhores, que também só sabem olhar de esguelha para eles.
E o pior é que já ninguém é capaz de olhar de frente para os que andam de esguelha, e ter a determinação de acabar com toda essa ‘esguelhice’ estúpida e teimosa, mas de tal maneira entranhada, que parece já fazer parte dum aparato de democracia, que eles criaram, e de que se orgulham certamente, pois dele não se demarcam um milímetro.
Todos falam muito em diálogo mas, logo que se encaram de esguelha, lá despejam o monólogo intransigente e imutável, por mais horas, dias, meses, ou anos, que passem a arranjar, ou a inventar argumentos, para que nunca decidam nada. Nem sempre são todos iguais, mas a verdade é que também não se pode ceder, sempre que se é olhado de esguelha.
O caso da eleição do Provedor de Justiça é um bom exemplo. Já perguntei a mim mesmo, quem é que mais olha de esguelha e para quem, neste caso. Quem é que quer diálogo e quem é que apenas quer conversa de faz de conta. Ou ainda, a quem é que interessa que a situação se mantenha neste impasse.
Outra singularidade política, é a palavra, sim, a palavra de uns políticos e de outros políticos, tão próximos, ou tão afastados, com olhares de frente, ou com olhares de esguelha entre eles. Uns põem as mãos no lume por outros, mas nunca sabemos se se queimaram ou não. Enquanto uns juram a pés juntos que estão inocentes e quase ninguém acredita, outros julgam que lhes basta afirmar que, se eles o dizem, é porque é. E, curiosamente, quase toda a gente acredita. Palavras, palavras.
De esguelha andam as conversas da campanha que agora vai terminar, sem que ninguém tenha vislumbrado o que é que eles querem, afinal, para lá do simples, lógico e interessante facto de quererem ir para o bem bom. Sobre isso nada disseram. Como já olhei de esguelha para eles, mas com muita atenção, concluí que, nas legislativas, eles vão falar sobre a Europa.
É por tudo isso que o país anda de esguelha consigo próprio.