Será assim?
Em tempos que já lá vão, há umas boas dezenas de anos, lembro-me de ver nas longínquas serras que se avistavam da minha aldeia, longas colunas de fogo que duravam semanas, sem que ninguém as fosse combater.
Como começavam os fogos, ninguém questionava, tal como não se sabia como deixavam de devastar essas serras. Não se falava de incendiários e ninguém se preocupava com o fenómeno. Era a natureza a determinar a sua própria limpeza.
Hoje, os fogos combatem-se nos lugares mais inóspitos, com os meios mais sofisticados e bombeiros que passam noites e dias sem um momento de descanso. Além do esforço hercúleo de outras corporações e do povo anónimo que vê os seus haveres serem devorados pelas chamas.
O país arde perante o desespero de quem não vê a lucidez que parece não existir em quem não quer, ou não pode, ver a realidade atual destes incêndios.
Fala-se muito de segurança dos caminhos e estradas, em limpeza das matas, em espécies florestais mais ou menos combustíveis, em penas mais severas para os criminosos de vária ordem, nos interesses obscuros de quem lucra com os negócios dos queimados, etc.
Porém, apesar dos incêndios dependerem de tudo isso, há fatores que têm sido menorizados. Tudo parece indicar que não há vontade de quem de direito, para descobrir quem está por detrás de tantas ignições. E essa solução parece ser a mais execuível.
Será sempre um sonho imaginar que é possível limpar, no país todo, os matos, as ervas e arbustos que crescem todos os anos, algumas, mais que uma vez por ano. Isso, além de ter um custo incomportável, não haveria condições humanas para o fazer.
Tudo parece indicar que há efetivamente um gang que planeia milimetricamente os incêndios, no que toca aos locais de início e condições de propagação. Locais onde o acesso é muito difícil a qualquer pessoa e indicativas as horas noturnas a que começam.
O país está a viver convulsões de raiva e de ódio como talvez nunca tenha conhecido. Há quem seja capaz de tudo para satisfazer as suas frustrações e vingar a perda dos seus ideais e interesses. Que, em muitos casos, são mesmo doentios.
E quem não vê maneira nem condições para lutar às claras, atira-se para situações criminosas, bem encobertas, em que se destrói de tudo, inclusivé vidas humanas.
O povo costuma dizer que vale tudo menos tirar olhos. A verdade é que, cada vez mais, vale mesmo tudo, ainda que o país fique mesmo destruído, desde que mude de donos disto tudo.